Morte de Bin Laden – Nem todos comemoraram

Há uma década, o nome Osama bin Laden era constantemente ouvido nas capitais do mundo árabe: ele era líder, sheike até herói para muitas pessoas. Mas, depois de sua morte, o homem que prometeu a liberdade ao mundo árabe foi reduzido a uma simples nota de rodapé no livro das revoluções que estão acontecendo em alguns países da região que ele “defendia”.

Ontem, as reações à morte de Osama no Oriente Médio foram as mais diversas: desde raiva nos locais mais conservadores do Líbano ao regozijo entre os muçulmanos xiitas do Iraque, vítimas da carnificina ocorrida em nome da Al-Qaeda.

Mas a reação mais notável deu-se em países como Tunísia e Egito, onde seu nome é o eco do passado, dividido entre Ocidente e Oriente, entre onipotência americana e impotência árabe. Nos últimos meses, parecia que as únicas pessoas a citarem o nome de Osama eram os porta-vozes dos poderosos, como Moammar Kadafi e Hosni Mubarak, que evocavam as ameaças da Al-Qaeda para justificar o apego ao poder em um mundo árabe que hoje pouco se parece com o cenário que ele ajudou a criar.

Para um homem que teve grande responsabilidade em duas guerras e na intensificação da intervenção norte-americana norte da África, Iêmen e Iraque, sua morte serviu, mais do que qualquer coisa, como epitáfio de uma era. Para muitos, em um mundo árabe onde três quintos da população têm menos de 30 anos, o ataque às Torres Gêmeas de 11 de setembro de 2001 é apenas uma lembrança da infância.

– Bin Laden era o fenômeno de uma crise de tempos passados – diz Radwan Sayyid, professor de Estudos Islâmicos da Universidade Libanesa de Beirute.

Para ele, o mundo árabe tem, hoje, outras questões para debater.

– O problema não é destruir, mas construir algo novo: um novo estado, uma nova autoridade, uma nova sociedade civil.

Chamados de vingança e ódio já começaram
A perseguição do governo norte-americano desperta, há muito tempo, suspeitas entre os árabes, que continuam céticos em relação aos motivos e alvos norte-americanos, já que Washington já apoiou ditaduras em países árabes e fez alianças sem restrições com Israel.

Depois da notícia do assassinato, houve muitos chamados de vingança e ódio, muitos deles feitos publicamente pelo primeiro-ministro palestino e chefe do Hamas, Ismail Haniyeh. Ele chamou Osama de guerreiro árabe e muçulmano. Outros sugeriram que a batalha simbolizada por Bin Laden entre Estados Unidos e militantes islâmicos continuará, e, de fato, sua organização sempre foi suficientemente disseminada para sobreviver à sua morte.

– O senhor Obama falou que a justiça havia sido feita. Vamos ver de que forma. Desaprovamos as reações e celebrações norte-americanas. Qual é a grande vitória, a grande conquista? Bin Laden não é o fim do movimento – desafiou Bilal al-Baroudi, pregador muçulmano conservador de Trípoli.

Mas as opiniões foram distintas. Marwan Shehadeh, ativista islâmico e pesquisador da Jordânia, argumentou que os árabes veriam a morte de Bin Laden através das lentes da grande antipatia pelas forças armadas norte-americanas.

– Ele era uma figurar popular e carismática para muitas pessoas, mesmo entre os mais moderados.

É considerado modelo da luta contra a hegemonia americana. Concordando ou não com suas ideologias, ele é visto como um batalhador revolucionário – diz Shehadeh.

Ao mesmo tempo, ele acredita que, dentro do mundo muçulmano, a morte de Bin Laden irá simbolizar uma revolução diferente: o afastamento da violência e a aproximação a outras formas de engajamento político.

– Este fato vai ser uma virada na história do movimento islâmico. É um momento em que os extremistas estão recuando, dando mais espaço a correntes moderadas que têm uma visão mais compreensiva – diz.

Embora ainda experimentais, as revoluções árabes, particularmente as do Egito e da Tunísia, introduziram uma nova fórmula política, na qual as correntes islâmicas talvez tenham uma fatia do bolo. Enquanto um grande ódio permanece sobre as forças armadas norte-americanas e sobre o tratamento de Israel aos palestinos, a atenção constantemente é virada para eles, enquanto ativistas debatem que tipo de estado deve emergir.

Alguns temem que a morte de Osama tire o foco do desafio.
– Há semanas estamos todos discutindo as revoluções nos países árabes, sonhando com nosso novo futuro. Agora temo a reação dos grupos próximos a Bin Laden, que podem trazer de volta a ideia de que árabes são terroristas e simplesmente odeiam a América – disse Lotfy.

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