CHINA – Nova atitude pode causar atritos nas relações com outros países

ANDREW BROWNE

As relações exteriores da China, principalmente com os Estados Unidos e seus vizinhos asiáticos, têm nos tempos modernos se baseado na doutrina de prudência expressa pela famosa máxima de Deng Xiaoping — "taoguang, yaghui" — "esperar nossa oportunidade; esconder nossa capacidade".

O ex-líder reformista calculou corretamente que, uma vez que o mundo compreendesse todas as consequências da ascensão do gigante asiático, ele se exaltaria e perturbaria a harmonia externa de que a China precisa para levar adiante seu desenvolvimento econômico. Deng suspeitava também que os EUA no fundo queriam impedir o progresso da China e que, quanto mais propaganda a China fizesse do seu poder, mais os americanos conceberiam estratégias para "conter" um futuro rival. Por hora, raciocinou Deng, o melhor é manter a discrição.

Mas agora, sob a liderança do presidente Xi Jinping, essa antiga precaução vem sendo notavelmente ignorada.

Em novembro, a China surpreendeu o mundo ao declarar uma zona de identificação de defesa aérea sobre uma imensa área no Mar da China Oriental que é cruzada por rotas aéreas comerciais. A zona de defesa propriamente dita não é motivo para preocupação: muitos países têm zonas semelhantes como uma proteção extra ao seu espaço aéreo. Mas a maneira brusca com que foi anunciada — o governo americano, aparentemente, foi informado no último minuto —, e o fato de ela cobrir ilhas administradas pelo Japão, mas reclamadas pela China, foi para muitos analistas de política externa um sinal de que a China está se preocupando cada vez menos com o modo como suas ações são percebidas. Aí, somente alguns dias depois, um cruzador da marinha americana, o USS Cowpens, teve que fazer uma manobra súbita para evitar uma colisão com um navio de guerra chinês no Mar da China Meridional, segundo a Frota do Pacífico dos EUA. Navios dos EUA e da China têm um histórico de incidentes semelhantes em meio ao esforço chinês de afastar a marinha americana do seu litoral.

Ainda assim, dizem analistas, quando considerados em conjunto, esses episódios ressaltam uma mudança fundamental no comportamento de um país cada vez menos inibido em exibir seu poder. A China, em suma, está mostrando que seu modo paciente de se firmar no cenário mundial está chegando ao fim: sua hora chegou.

Já foram propostas várias teorias para explicar essa mudança de atitude da China. Entre elas, o nacionalismo crescente e um possível desejo de Xi de acalmar o grupo linha-dura das forças armadas. Outra seria a visível necessidade de desviar a atenção do público das agitações sociais ligadas à corrupção nos altos escalões, das apropriações de terras, da desaceleração da economia e de outros problemas. Além disso, a zona de defesa aérea se encaixa na disposição da China de abrir brechas no que chama de "primeira linha de ilhas" — que se estende da área entre o Japão e a sua costa e passa por Taiwan e o norte das Filipinas, bloqueando seu acesso ao Pacífico. E os armamentos que a China está desenvolvendo para este propósito — especialmente submarinos e mísseis — atingiram um nível de sofisticação que está começando a influenciar os cálculos da estratégia americana.

A China agora sente que está lidando com os EUA de igual para igual e não precisa dissimular suas intenções.

Tudo isso pode ter profundas consequências para as relações entre China e EUA — geralmente consideradas as mais importantes relações bilaterais do mundo.

De fato, os alicerces desta relação já estão abalados, o que a torna mais vulnerável a choques. Uma pesquisa recente dos sentimentos do público americano e chinês e das várias elites dos dois países — entre militares, empresários, autoridades do governo, membros da mídia e acadêmicos — mostra uma baixa confiança mútua entre as duas potências. E embora poucos — apenas 15% dos americanos e 12% dos chineses — considerem os dois países inimigos, há uma forte percepção de que eles são concorrentes, não parceiros, segundo uma pesquisa realizada por centros de estudos em Pequim e Washington, incluindo a Fundação Carnegie para a Paz Internacional.

A questão agora é o que vai acontecer quando essa nova atitude afirmativa da China se chocar com a determinação americana de continuar sendo um poder dominante no Pacífico.

A desconfiança poderia se transformar em hostilidade? A concorrência em conflito?

Felizmente, diz Michael D. Swaine, associado sênior da Fundação Carnegie e um dos autores da pesquisa, tal situação ainda estaria muito distante. "Nenhum dos lados quer se prender a uma relação de genuíno antagonismo", diz ele.

Outros fatores positivos incluem ainda um alto grau de interdependência econômica que, para o bem ou para o mal, liga os destinos dos dois países, uma razoável admiração mútua (os americanos, por exemplo, admiram a ética de trabalho dos chineses; os chineses reconhecem a inventividade dos americanos) e um grande desejo de melhorar a relação.

Mas, acrescenta Swaine, o "catalisador mais importante" para o azedamento das relações são as disputas territoriais da China com aliados dos EUA e as atividades militares americanas ao longo da costa chinesa.

Dado que a China está ampliando suas exigências territoriais e os EUA não têm a intenção de ceder seus direitos de navegar em alto mar, tudo indica — no mínimo — algumas sérias turbulências adiante.

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