Ricardo Fan – Redação Defesanet
A história dos conflitos armados mostra que a escassez de meios convencionais frequentemente gera soluções improvisadas. Na Segunda Guerra Mundial, tropas soviéticas usaram tratores agrícolas convertidos em tanques leves; no Vietnã, guerrilheiros criaram armadilhas com bambu para compensar a inferioridade bélica; e, nas guerras do Oriente Médio e da África, as célebres “technical vehicles” — caminhonetes equipadas com metralhadoras e blindagem artesanal — tornaram-se símbolos da guerra irregular.
A improvisação no campo de batalha
Da utilização de placas metálicas em caminhonetes durante as guerras no Oriente Médio, até os “technicals” da Somália e da Líbia, a criatividade bélica surge quando os recursos industriais não conseguem atender à demanda do front.
Na guerra na Ucrânia, um conflito de desgaste marcado pela alta tecnologia dos drones e pela carência de equipamentos modernos em algumas frentes, o fenômeno se repete: tropas russas têm recorrido à adaptação de veículos civis com blindagem improvisada para tentar sobreviver.
O surgimento dos veículos “lapsha”
Imagens recentes mostram pequenos automóveis russos convertidos em plataformas de assalto rudimentares. Estruturas de aço soldadas, sucata, telas metálicas e até galhos formam verdadeiras “gaiolas” em torno dos veículos. Os próprios soldados apelidaram a solução de “lapsha” (“macarrão”, em russo), pela aparência desordenada dos reforços.
A estética pós-apocalíptica, comparada por observadores à franquia Mad Max, ilustra não apenas a criatividade das tropas, mas também as dificuldades logísticas enfrentadas por Moscou. Sem blindados suficientes para equipar as unidades de assalto, automóveis civis são requisitados ou apropriados, recebendo uma blindagem artesanal de efeito duvidoso.

Da “gaiola de tanque” à adaptação civil
A improvisação não é nova no conflito. Já nos primeiros meses da invasão, blindados russos passaram a ser equipados com grades e telas metálicas contra drones kamikaze e munições de permanência (loitering munitions). O que se observa agora é a transposição dessa lógica para plataformas mais leves, permitindo que até carros civis sejam usados com alguma proteção mínima.
A ideia central é criar um obstáculo físico que dificulte o impacto direto de drones FPV ucranianos, que têm se mostrado uma das armas mais letais e custo-efetivas do conflito. Ainda assim, operadores ucranianos apontam que a eficácia é reduzida, já que os drones podem manobrar e atingir brechas, ou mesmo explodir dentro da própria estrutura.

Síntese da pressão logística
A proliferação desses veículos improvisados indica a pressão crescente sobre a indústria de defesa russa. Estima-se que, desde fevereiro de 2022, centenas de blindados foram destruídos ou danificados, enquanto a reposição é lenta e insuficiente. Para manter a mobilidade tática, muitas unidades são forçadas a recorrer a soluções improvisadas, assumindo maiores riscos no campo de batalha.
Impacto estratégico e psicológico
Ainda que limitados em eficácia, os veículos “estilo Mad Max” têm um efeito simbólico relevante. De um lado, demonstram resiliência e adaptação das tropas em condições adversas. De outro, expõem fragilidades estruturais de uma força que, teoricamente, deveria sustentar a guerra com meios industriais modernos.
O contraste entre drones de precisão guiados por vídeo e veículos civis recobertos por sucata ilustra a assimetria crescente do conflito. Enquanto a Ucrânia explora tecnologia relativamente acessível para infligir baixas, a Rússia responde com improvisação defensiva, em um ciclo que reforça o caráter de guerra de desgaste.
Considerações finais
A presença de veículos “lapsha” na linha de frente evidencia que o conflito na Ucrânia entrou em uma fase prolongada, onde tanto inovação tecnológica quanto improvisação artesanal coexistem. Se, por um lado, os drones consolidam-se como protagonistas da guerra moderna, por outro, a improvisação russa sugere que, na ausência de soluções industriais em escala, a sobrevivência ainda depende da engenhosidade no campo de batalha.
Fonte: MSN / imagens: Defence Blog





















