Equador usa Assange como estratégia política

"O governo do Equador não tem nada a ver com o caso Assange", afirma Winfried Weck, diretor do escritório da Fundação Konrad Adenauer em Quito. "Para eles, a questão é apenas se posicionar, e mostrar aos americanos e aos europeus que não aceitam interferências, que consideram a identidade e soberania nacional como o bem mais alto."

No início de setembro, Weck fechará a representação da instituição alemã na capital equatoriana, após mais de 50 anos de presença no país. O motivo é que desde 2011 o Equador se concede o direito não apenas de ter acesso aos planejamentos anuais das fundações políticas e ONGs em seu território, como também de alterá-los.

"Essa condição não era mais aceitável para nós", esclarece o diretor. "Estamos fechando o escritório por motivos políticos e vamos procurar outras possibilidades de nos engajar no país." As três outras fundações políticas alemãs no Equador – a Friedrich Ebert, a Rosa Luxemburg e a Hanns Seidel – prosseguem com seu trabalho.

Liberdade de imprensa ameaçada

A democrata-cristã Fundação Adenauer não é a única a criticar o governo local. Também a ONG Repórteres Sem Fronteiras (RSF) se preocupa com a liberdade de opinião política no país. No ranking atual de liberdade de imprensa da RSF, o Equador ocupa o 95º lugar, entre 180 países.

"Para além da proteção de whistleblowers internacionais, o presidente Rafael Correa não deveria esquecer a liberdade de imprensa no Equador", já apelava no final de junho o diretor-gerente da organização, Christian Mihr, em comunicado à imprensa.

O presidente assinou uma nova lei para a imprensa que concede ao Estado amplas possibilidades de interferência no trabalho dos jornalistas e que poderia ser uma porta para a censura.

Correa não se deixa impressionar por críticas desse tipo. "Dois anos de permanência de Assange na Embaixada do Equador em Londres. Onde está a imprensa livre e independente? O que aconteceria se isso acontecesse no Equador?", pergunta o chefe de Estado a seus seguidores no Twitter.

O chanceler Ricardo Patiño – que viajou especialmente para Londres, por ocasião do segundo "jubileu" do fundador do WikiLeaks na embaixada local – também se manifestou na rede social: "Quanto tempo ainda vamos ter que esperar até que a imprensa exija sua liberdade?"

Apesar do apoio de Correa a Julian Assange, Jonas Wolff, especialista em América Latina da Fundação de Hessen para Pesquisa da Paz e Conflitos (HSK), não vê entre os dois uma linha política comum.

"É verdade que ambos lutam contra grandes conglomerados de mídia", confirma. Porém, ao contrário da plataforma aberta WikiLeaks, o presidente equatoriano não apoia os pequenos veículos de imprensa no próprio país, mas sim "profere ameaças contra eles".

Ofensiva político-estratégica

Wolff interpreta a coletiva de imprensa conjunta de Assange e Patiño na embaixada em Londres como ofensiva político-estratégica. Segundo ele, "o governo do Equador quer aproveitar o caso Assange para se projetar na esfera pública global como paladino dos direitos humanos e do asilo".

No entanto, também na política de asilo, o país vai perdendo seu papel de vanguarda. Desde a aprovação da nova lei de asilo, em maio de 2012, o nível de reconhecimento "retrocedeu dramaticamente", segundo dados do Alto Comissariado da ONU para Refugiados (Acnur).

"Há um grande abismo entre as normas progressistas, prescritas na Constituição, e o acesso dos refugiados a seu direito, na prática", aponta o comissariado das Nações Unidas. No momento, o Equador ainda abriga a maior população de refugiados da América Latina. Segundo a Acnur, cerca de 123 mil asilados vivem no país, dos quais 98% da vizinha Colômbia.

É questionável se Assange jamais poderá viver em seu asilo no Equador. Também o anúncio de que pretende deixar a embaixada parecer ser mais um desejo do australiano de 43 anos do que a realidade.

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