CIGS – Entrevista Cel Gelio Fregapani

 

Publicado Revista Verde Oliva 225
Outubro 2014


Considerado uma das melhores mentes do Exército Brasileiro e por ter comandado o Centro a partir do ano de 1980,o Coronel Gelio Fregapani, 6º Comandante,  foi convidado para falar sobre o CIGS e sobre a Amazônia.

Politizado, consciente e articulado, Coronel Fregapani fundamentou as leis de Guerra na Selva e ajudou a construir a mística do CIGS.
 
Verde-Oliva – O que significa o CIGS em sua carreira militar?

Cel Fregapani – Creio ter deixado uma marca por onde passei, mas o tempo de comando no GIGS foi o ápice. Sempre pensei, desde que me dei por gente, em influir decisivamente para conseguir a vitória na guerra. Sei que se começa a vencer formulando a doutrina correta para a situação e forjando os instrumentos do combate – homens treinados e armas eficazes para a situação. Foi isto que iniciei a fazer.
 
Verde-Oliva – O senhor testemunhou boa parte da criação do CIGS e o comandou. Quais as lembranças, as maiores dificuldades e as saudades da época?
 
Cel Fregapani – As lembranças principais são os grandes desafios. O gostinho do perigo e do desconhecido. Da ousadia do Major Teixeira em sair das regras para assegurar o apoio logístico. Da dedicação dos quadros e das inovações de um oficial o Capitão Leal Santos. Lembro-me da dificuldade da maioria em pensar no know-why e não somente no know-how e na dificuldade em inovar e avançar. A saudade que me toca é a do companheirismo, dos desafios e do gosto do perigo.
 
Verde-Oliva – Muitos de seus amigos e admiradores o descrevem como mente pensante, um patrimônio intelectual do Exército Brasileiro. Comenta-se que o senhor realmente tem opiniões claras e bem formadas sobre muitos assuntos nacionais e internacionais na área da sociologia, economia e na geopolítica.  Onde o CIGS ajudou a formar o pensador Gelio Fregapani?
 
Cel Fregapani – Por ter tomado parte na epopeia da fundação do CIGS, por conhecer o curso norte-americano de Operações na Selva e por ter estudado as campanhas que ocorreram no mundo, formulei mentalmente a doutrina que me pareceu mais adequada para enfrentar e vencer uma guerra no nosso ambiente de selva. Escrevi algo sobre o assunto em revistas militares e, no desempenho de outras funções, tive a sorte e a oportunidade de fazer inovações.

Talvez, devido a esses dois fatores, tenha recebido o honroso convite para comandar o CIGS. Claro que isso era um sonho, mas mesmo assim respondi de uma forma irreverente: “Meu General, é o mesmo que perguntar se macaco quer banana, mas tenho minhas ideias sobre como desenvolver uma guerra na selva. Se não puder implementá-las, prefiro não ir”.
 
Pela resposta do General Navarro, “O convite é precisamente pelas suas ideias”, considerei-me com carta branca e arrisquei o que talvez nenhum outro comandante poderia fazê-lo. Com a graça de Deus, deu certo e isto transformou o CIGS, que já era respeitado, na mais famosa Escola de Guerra na Selva do mundo.

A fama do CIGS é que se refletiu em mim, fazendo com que minhas ideias (em constante evolução) ficassem conhecidas. Houve casos de até boas ideias serem atribuídas erroneamente a mim. Lembro-me de uma declaração em uma grande revista nacional “Não quero inovar nada, mas decidi cooperar com o progresso da região.”
 
Declaração que nunca fiz, mas não desmenti. Na verdade sempre quis inovar e muitas vezes consegui.
 
Verde-Oliva – O senhor é um crítico das intervenções por vezes desastrosas na região, como as demarcações de terras indígenas e as constantes invasões de fronteira por parte de refugiados. Onde o CIGS pode interferir de forma positiva no debate civil e militar sobre tais temas? É possível?
 
Cel Fregapani – O CIGS é apenas uma escola. Deve inspirar e propor uma doutrina; mas aceitar, modificar e implementar cabe ao Estado-Maior do Exército. A herança que tivemos da nossa matriz – o Jungle Operations dos EUA – resumia-se ao treinamento individual e de escalão até pelotão (a moda deles que não nos servia) e já tinha sido em parte adaptado, inclusive por mim.
 
Quando comandei, prossegui com inovações e criamos um curso para oficiais superiores no qual estudávamos as guerras na selva da História e de situações hipotéticas. Naturalmente, fizemos propostas que foram bem recebidas. Este é o papel do CIGS; mas, pessoalmente, podemos influir mais. 

A minha influência é facilitada pela fama do CIGS. Quanto à perigosa situação indígena, o CIGS pode ajudar; porém, o CMA e o Estado-Maior do Exército têm que pensar e implementar ações para conseguir aliados entre índios e, principalmente, garimpeiros. Estes últimos, na situação atual, seriam a chave do sucesso ou do fracasso.
 
Verde-Oliva – O CIGS é uma aula de Amazônia, isso é fato. Em suas fileiras, inúmeros militares de nações amigas vêm aprender sobre a região, a partir do Curso de Operações na Selva. Geopoliticamente falando, é seguro dialogar conhecimento com nossos vizinhos?
 
Cel Fregapani
– Isto deve ser uma ação diplomática para fazer amigos e pensada no Itamarati. Cabe ao CIGS agir para conquistar respeito e amizades, e não dar “o pulo do gato”.
 
Verde-Oliva – E os próximos 50 anos?

Cel Fregapani – Por melhor que seja uma doutrina, uma tropa ou qualquer técnica ou tática, ela será superada se não evoluir. É necessário um pensamento contínuo de evolução antes mesmo de novos materiais, procedimentos e dispositivos que serão necessários. A deusa da vitória sorri para o exército que se antecipa. Depende só de nós evoluirmos antes dos demais.

Selva!

Nota DefesaNet

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