Sistema Bancário – Regras contra o terrorismo limitam acesso


Rob Barry e
Rachel Louise Ensign


As bagagens de mão colocadas no compartimento sobre o assento 7G de um voo recente dos Estados Unidos para Dubai continham milhares de notas — de US$ 20, US$ 50 e US$ 100, todas ordenadamente embaladas com elásticos e plástico.

O dinheiro foi trazido à bordo por Abdi Warsame, imigrante somali e empregado de uma firma de transferências de dinheiro que perdeu o acesso ao sistema bancário internacional em 2015. A empresa agora transporta dinheiro manualmente.

Desde então, as notas desapareceram do sistema financeiro dos EUA. Depois de chegar a Dubai, elas entraram numa rede obscura de comércio, empréstimos e transferências que se espalha pelo leste da África e o Oriente Médio.

Os bancos americanos encerraram milhares de contas de pessoas e organizações consideradas suspeitas, de alto risco ou difíceis de monitorar — inclusive empresas de transferência de dinheiro, bancos estrangeiros e organizações sem fins lucrativos que operam no exterior. Essa prática exclui do sistema financeiro tanto inocentes como aqueles que as autoridades mais gostariam de vigiar, uma consequência não antevista pelo governo americano.
Thomas Curry, chefe da Controladoria Geral da Moeda dos EUA, reconheceu os possíveis perigos. “Transações que seriam feitas legalmente podem ficar ocultas”, disse ele em março, numa conferência com executivos de bancos e reguladores.

Assim como as empresas de telecomunicações ajudam a Agência de Segurança Nacional dos EUA, bancos e outras instituições financeiras do país têm sido recrutados pelo governo para identificar e relatar sinais de lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo. Temendo multas altas caso deixem de identificar infratores, os bancos têm evitado qualquer um que pareça suspeito. Com isso, as empresas excluídas são forçadas a buscar alternativas — como despachar dinheiro em malas para o exterior — e centenas de milhões de dólares acabam saindo do sistema bancário global, segundo um grupo de parlamentares americanos que, em janeiro, solicitou uma análise do problema à Agência de Responsabilidade do Governo (GAO, na sigla em inglês), o braço investigativo do Congresso.

“Todo o fluxo de dinheiro vai para a clandestinidade e isso se torna contraproducente para o propósito original de rastreá-lo”, diz Dilip Ratha, economista-chefe da unidade do Banco Mundial que estuda transferências de dinheiro a distância.

Os imigrantes vivendo nos EUA enviaram cerca de US$ 54 bilhões para fora do país em 2014, estima o Banco Mundial. Entre as empresas que transferem dinheiro estão gigantes globais, como Western Union Co. e MoneyGram International Inc., e empresas pequenas, como a de Warsame, o imigrante somali.

Uma pesquisa recente do Banco Mundial com 82 empresas de transferência de dinheiro concluiu que mais da metade perdeu contas bancárias em 2014. Cerca de 25% dos entrevistados fecharam ou agora operam sem contas bancárias corporativas.

Desde a aprovação do Patriot Act, em 2001, exigências mais rigorosas de divulgação geraram um fluxo de dados extraordinário de bancos e outras instituições financeiras. Os relatórios de atividade suspeita (SARs, na sigla em inglês) de clientes — que chegam a 55 mil por dia — vêm principalmente de bancos e empresas de serviços financeiros, mas também de cassinos, corretoras de ações e seguradoras. Cerca de 200 milhões dos 220 milhões de registros obtidos desde 2001 são documentos obrigatórios emitidos quando os clientes realizam operações de mais de US$ 10 mil.

Autoridades do governo dos EUA dizem que o sistema revolucionou sua capacidade de investigar fraudes, o tráfico de drogas e o financiamento do terrorismo. Através da análise desses dados, o governo extrai até mil pistas por mês relacionadas a terrorismo estrangeiro, inclusive do Estado Islâmico, que são entregues a investigadores, dizem as autoridades. As instituições financeiras divulgaram suspeitas de financiamento ao terror cerca de 2.200 vezes em 2015.

O conteúdo dos relatórios sobre atividades suspeitas é secreto e a simples revelação da existência deles é um crime federal. Os clientes identificados pela rede de vigilância nunca são informados. Os bancos raramente ficam sabendo se seus relatórios levam a prisões e as autoridades não informam quando eles são usados numa investigação.

A Western Union informa que hoje gasta US$ 200 milhões por ano no monitoramento de atividades suspeitas, como clientes que enviam dinheiro para regiões de alto risco no Oriente Médio. Analistas às vezes examinam perfis de clientes nas redes sociais em busca de propaganda ligada ao terrorismo. A empresa aprimorou seus sistemas de monitoramento depois que teve de pagar US$ 94 milhões a quatro Estados americanos em 2010, num acordo ligado a lavagem de dinheiro.
 

O banco J.P. Morgan Chase & Co. tem hoje cerca de 9 mil funcionários dedicados a combater a lavagem de dinheiro e excluiu milhares de clientes considerados de alto risco.

Essas exigências dos EUA têm alcance global. O codiretor-presidente do banco alemão Deutsche Bank AG, John Cryan, disse a um painel do Fórum Econômico Mundial de Davos, em janeiro, que regulações “muito, muito onerosas” têm exigido que os bancos assumam novos papéis. “Temos sido lentos em reconhecer que somos uma extensão da fiscalização das leis”, disse ele.

Autoridades que analisam os dados reconhecem o alto custo de vigiar dezenas de milhões de clientes bancários. Alguns bancos dizem que o monitoramento é muito amplo, o que pode comprometer a eficácia.

Em 1998, quando Warsame criou a empresa de transferência de dinheiro, a população somali nos EUA havia crescido mais de dez vezes devido ao colapso do governo da Somália, e as pessoas precisavam enviar dinheiro para seu país de origem. A empresa de Warsame pede dados de identificação aos clientes, checa os nomes em listas de vigilância do governo e passa por inspeções de reguladores. Ele e a firma não foram acusados de qualquer irregularidade pelas autoridades.

Desde 2008, contudo, os bancos começaram a rejeitar a empresa de Warsame. Em 2010, ela conseguiu abrir uma conta no Merchants Bank of California NA. Mas, em 2014, a Controladoria Geral da Moeda ordenou que o Merchants Bank deixasse de processar transações feitas para a Somália se os clientes não conseguissem “garantir a legitimidade das fontes e o uso dos fundos”, afirma a ordem de 2014.

O fechamento da conta tornou o negócio numa operação arriscada de transporte de dinheiro. “Não sei quanto tempo poderei continuar”, diz Warsame.

Nota DefesaNet

Um dos pontos chaves na Operação Lava-Jato são os cordo de controle do Sistema Bancário. Tanto no Brasil como no exterior.

Surpreende que no Brasil os grandes bancos não tenham aparecido na Operação Lava-Jato. Em especial pelas elevadas quantidades de valores transferidos ao exterior.

O Ministério da Fazenda do Brasil tem o COAF – Conselho de Controle de Atividades Financeiras. Considerado a Unidade de Inteligência Financeira e faz parte do SISBIN, Sistema Brasileiro de Inteligência.
 

O Editor

 

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