Meio míssil, meio avião

A Força Aérea dos Estados Unidos realizou ontem um teste com o jato hipersônico X-51A WaveRider, que sobrevoou o Oceano Pacífico com o objetivo de atingir uma velocidade de cerca de Mach 6 (seis vezes a velocidade do som). A esta velocidade, que pode chegar a 7.200 km/h no ar, a aeronave poderia sair de Londres e chegar a Nova York em aproximadamente uma hora. Hoje, o trajeto leva em torno de sete horas para ser percorrido por um avião comercial comum.

Um bombardeiro B-42 lançou o jato não tripulado e sem asas da Base Aérea de Edwards, na Califórnia, de uma altitude de aproximadamente 15 mil metros, mas o resultado ainda não foi divulgado. A previsão era que a aeronave seria solta deste ponto e, após uma queda livre de cerca de quatro segundos, o motor acionado. Então, o WaveRider subiria mais uma vez a uma altitude de 21 mil metros, onde poderia chegar aos Mach 6 devido à menor densidade, e resistência, do ar. O voo de teste estava previsto para durar cerca de cinco minutos. No final, a aeronave se quebraria em pedaços e cairia no Pacífico. Não há planos de recuperar o aparelho.

—O X-51 é um precursor para voos maiores e mais constantes. A esperança é avançar a competência nesta tecnologia —declarou Darryl Davis, presidente da Boeing Phantom Works, que construiu a aeronave.

UMA NOVA GERAÇÃO DE MOTORES

Para se ter uma ideia da velocidade do WaveRider, o avião supersônico Concorde, de 1969, voava de Londres a Nova York em pouco mais de três horas e podia alcançar no máximo 2.652 km/h. Atualmente, o avião comercial mais rápido do mundo é o Cessna Citation X, que tem a velocidade máxima de 950 km/h, ou Mach 0.9, e transporta apenas sete passageiros.

Esta foi a segunda tentativa do voo do X-51. Na primeira, em junho do ano passado, o jato viajou a Mach 5, mas falhou em alcançar a velocidade máxima desejada. Em agosto de 2011, os cientistas militares americanos tentaram lançar um avião não tripulado que deveria chegar a Mach 20 (20 vezes a velocidade do som). Os pesquisadores, porém, perderam o contato com o veículo de teste, batizado Falcon Hypersonic 2 (HTV-2), depois que ele se separou do foguete que o lançou, após nove minutos no ar.

O projeto do WaveRider, financiado pelo Pentágono e pela Nasa (mais de US$ 140 milhões investidos), faz parte dos planos para o desenvolvimento de mísseis mais rápidos. O Pentágono terá, então, a possibilidade de atingir alvos ao redor do mundo em questão de minutos.

Os militares americanos apostam na nova tecnologia por ser promissora e por sua capacidade de fugir dos contra-ataques inimigos. O esforço para desenvolver uma nova geração de motores hipersônicos, chamados scramjets, pode levar à produção de veículos que chegam a velocidades que não podem ser obtidas a partir de tradicionais motores de turbina a jato. Especialistas acreditam que mísseis nestas velocidades também são a melhor maneira de atingir um alvo em qualquer parte do globo em uma hora ou menos.

“Restaurar a vantagem estratégica requer alta velocidade, alcance e escala. Tecnologias hipersônicas têm o potencial de nos fornecer a dominância para apoiar futuras variadas missões de segurança nacional”, diz a Agência de Pesquisas de Projetos Avançados em Defesa Americana (Darpa), órgão ligado ao Pentágono.

O teste, porém, não tem objetivos apenas militares. Ele servirá também para fornecer informações para projetos em andamento para criar uma aeronave supersônica. A pesquisa pode levar à construção de um avião comercial capaz de atingir velocidades maiores do que os jatos atuais. A Companhia Europeia de Defesa Aeronáutica e do Espaço (EADS) acredita que os voos hipersônicos tripulados possam ser uma realidade em um futuro próximo.
 

ESPECIALISTAS VEEM EXPERIÊNCIA COM OTIMISMO


—Há interesse de ambos os lados do Atlântico para pular uma geração e passar do voo supersônico ao voo hipersônico —disse Peter Robbie, vice-presidente de desenvolvimento de negócios da EADS à BBC. —A ideia de ir de Tóquio a Paris em duas horas e meia é muito atrativa para as comunidades de negócios e políticas. Acho que por volta de 2050 já existirá uma aeronave nestes moldes.

Dora Musielak, especialista em propulsão de alta velocidade baseado na Universidade do Texas, nos Estados Unidos, disse ao “Los Angeles Times”que a possibilidade de voos hipersônicos tripulados não é apenas um sonho para cientistas e consumidores:

—Uma vez que a tecnologia militar demonstre o conceito, este tipo de transporte poderá levar passageiros sem dificuldades.

Robert Mercier, diretor de tecnologia do Laboratório de Pesquisas das Forças Armadas dos EUA, comparou o feito à passagem dos aviões a hélice para os movidos a jato.
 

Ficha técnica

VELOCIDADE: O WaveRider voa a até 7.200km/h, ou cerca de Mach 6. Essa é a medida de velocidade de uma aeronave em relação à do som (cerca de 1.236 km/h no ar). A título de comparação, o Concorde, aposentado em 2003, voava a Mach 2, e os aviões comerciais não chegam a romper a barreira do som.

ALTITUDE: Para chegar a Mach 6, o WaveRider precisa voar acima de 20 mil metros. Nessa altitude, a resistência do ar é menor. Por outro lado, também há menos oxigênio para a queima do combustível, o que obriga essas aeronaves a terem motores extremamente potentes. Além disso, estes motores consomem quantidades imensas de combustível.

TEMPERATURA: A fuselagem de aeronaves hipersônicas precisa ser extremamente resistente ao calor gerado pelo atrito com o ar em velocidade tão elevada. A temperatura do lado externo do casco pode chegar facilmente a 1.000 graus Celsius.

Compartilhar:

Leia também

Inscreva-se na nossa newsletter