Forças Armadas usam contingente recorde no combate à pandemia

Maria Cristina Fernandes

Valor  — São Paulo

08 Maio 2020

As Forças Armadas mobilizaram um contingente superior àquele da Segunda Guerra Mundial para as ações de combate à covid-19. São 29 mil militares do Exército, Marinha e Aeronáutica.

É um efetivo inferior àquele destinado à operação de paz das Nações Unidas no Haiti, chefiada pelo Brasil, mas os 37 mil militares daquela missão foram alocados ao longo de dez anos.

“A dificuldade desta operação é porque se trata de um inimigo invisível”, define o porta-voz do Ministério da Defesa, Carlos Chagas. A exposição dos militares colaborou para a emergência de 1.813 infectados e sete óbitos no efetivo de cerca de 390 mil das Forças Armadas. É uma proporção dez vezes maior que o contágio total no país. Entre os 29 mil militares alocados para o combate à pandemia, 800 são profissionais da saúde. Deles, apenas um, enfermeiro, veio a óbito.

O militar de mais alta patente morto pela pandemia foi um coronel-militar. Um dos generais alocados na Operação Acolhida, que se ocupa dos refugiados venezuelanos, em Roraima, foi contaminado, mas já se recuperou.

Aeronave Caravan voa da ALA3 Canoas/RS, para a ALA1 Brasília com máscaras para Forças de Segurança.

O número relativamente baixo de óbitos se deve ao monitoramento mais sistemático dos casos, com testagem daqueles que apresentam sintomas, e ao atendimento nos hospitais militares. A subnotificação, por isso, é inferior àquela estimada no país. A grande proporção de recuperados (38%) entre os infectados das Forças Armadas, relativamente à registrada no país (18%), também reflete o perfil etário mais jovem em relação ao conjunto da população.

Entre as medidas de monitoramento tomadas pelas Forças Armadas está a instalação de termômetros em algumas das instalações militares. São equipamentos capazes de medir a temperatura a uma distância de cinco centímetros, similares àqueles que já começam a ser empregados em alguns aeroportos. Entre os hospitais militares, os do Rio e do Pará são aqueles em que as unidades de terapia intensiva (UTIs) estão mais comprometidas.

A ocupação dos leitos no Rio vem, em grande parte, da quantidade de militares, da ativa e da reserva (não computados nos dados da Defesa), que vive no Estado. É lá que está o maior número de contagiados (999), e óbitos (quatro).

No geral, o quadro de contágio nas Forças Armadas obedece à incidência da doença no Brasil, com a notória exceção de São Paulo, Estado que abriga um terço dos casos e das mortes do país, mas onde os militares registram apenas 4,3% dos casos e nenhum óbito. Em Manaus, sede do centro de treinamento da selva, uma das vitrines de capacitação do Exército e onde foram registrados alguns dos primeiros casos da covid-19, a recuperação foi de 100%.

O alerta vindo da contaminação da tripulação de três porta-aviões nos Estados Unidos e do maior porta-aviões francês, o Charles de Gaulle, redobrou a atenção com as embarcações brasileiras. No Charles de Gaulle, 1,1 mil, de uma tripulação de 1,5 mil, foram infectados. A proporção de recuperados foi de 98,5%.

No dia 30 de abril de 2020, o Comando de Fronteira Rondônia /6º Batalhão de Infantaria de Selva (6º BIS), recebeu do 12º Batalhão de Suprimento (12º B Sup), da Guarnição de Manaus-AM, equipamentos de proteção individual (EPI) para a prevenção e combate à pandemia do novo coronavírus, como parte da Operação Covid-19, do Ministério da Defesa.

Segundo o almirante Carlos Chagas, houve contaminações em navios da Marinha brasileira mas todos foram retirados dos navios e tratados. Nas instalações nucleares, informou, não houve registro de contaminados. O almirante Chagas justifica o reforço das medidas de proteção dos efetivos das Forças Armadas pela necessidade de manter a capacidade de operação externa e interna, no combate à pandemia em todo o país.

Há 102 embarcações e 45 aeronaves das Forças Armadas sendo usadas no combate à covid-19. Agregam operações com o transporte de alimentos para a aldeia Ianomami de Maturacá (AM), para escolas públicas do Rio Grande do Sul e para caminhoneiros nas rodovias, descontaminação de hospitais na Bahia e no Mato Grosso desinfecção sanitária no metrô do Recife e em locais com grande afluxo de pessoas em Maceió, Marabá (PA) e Amambai (MS), vacinação de caminhoneiros em Santa Maria (RS), além do transporte de equipamentos hospitalares recuperados pelo Senai e de doações de equipamentos de proteção individual doados pela Fundação Itaú para a região Norte.

 

O acompanhamento do contágio e das operações das Forças Armadas é feito diariamente do ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, e os comandantes regionais por teleconferência. Dez subcomandos conjuntos foram criados especificamente para o combate à covid-19.

Foi a montagem desta operação que levou o general Edson Leal Pujol, comandante do Exército, a resumi-la, no início da pandemia, como “a maior missão” de sua geração. O foco nesta operação também levou os militares a adotar o cumprimento dos cotovelos que desgostou o presidente da República. É a prioridade dada pelas Forças Armadas a essa operação que leva ex-ministros da Defesa, como Nelson Jobim e Aldo Rebelo a não acreditar na adesão dos militares a aventuras golpistas.

A Marinha do Brasil (MB), por meio da Equipe de Resposta Nuclear, Biológica, Química e Radiológica (EqpRespNBQR) do Comando do 4º Distrito Naval (Com4ºDN), nucleada no 2° Batalhão de Operações Ribeirinhas (2°BtlOpRib), realizou, no dia 11 de abril, a descontaminação preventiva no Comando-Geral da Polícia Militar do Estado do Pará (PMPA), auxiliando no combate a propagação do novo Coronavírus.

Rebelo lembra que a montagem de operações do gênero é da tradição das Forças Armadas, seja qual for o presidente de plantão. Cita a epidemia do zika vírus que eclodiu no Brasil em 2016. O noticiário sobre a disseminação da epidemia já se espalhava pelo mundo e os voos provenientes do Brasil já ameaçavam ser interditados. Rebelo reuniu os três comandantes e disse que o governo precisava da ajuda das Forças Armadas.

Estiveram presentes o brigadeiro Nivaldo Rossato, o almirante Leal Ferreira e o general Villas-Boas. “Eles só perguntaram quando e se disseram dispostos a colocar até 200 mil em operação”, lembra Rebelo. O Brasil estava às vésperas do impeachment de Dilma Rousseff.

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