Segurança pública, a aposta para 2018

Natália Lambert, Rodolfo Costa

O ano de trabalho começou oficialmente para deputados e senadores e, diferentemente do imaginado, a reforma da Previdência não foi o foco principal dos discursos dos presidentes da Câmara e do Senado, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Eunício Oliveira (PMDB-CE), respectivamente. Na cerimônia de abertura do Legislativo, os dois fizeram questão de ressaltar a importância das mudanças nas regras das aposentadorias para o equilíbrio das contas governamentais, mas priorizaram a segurança pública — provavelmente o tema central das eleições de 2018.

No país em que mais de 60 mil pessoas foram assassinadas em 2016, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, os presidentes das duas Casas sugeriram um pacto nacional entre Executivo, Legislativo e Judiciário para resolver o problema. Eunício chegou a propor uma agenda de votações (veja quadro) a partir desta semana com esse objetivo. “É a nuvem cinza que turva os horizontes do Brasil: a insegurança pública”, comentou o presidente do Senado.

Para Eunício, a situação exige esforço e espírito público para reunir atividades parlamentares para criar um sistema nacional para a segurança pública. “Um novo sistema unificado de segurança pública permitirá mais rapidez em processos, o aprimoramento na troca de informações entre agentes e órgãos públicos, e o desenvolvimento de instrumentos de fiscalização, investigação e repressão mais modernos e essenciais para combater a nova configuração da criminalidade”, afirmou o peemedebista.

Deputado pelo Rio de Janeiro — estado que só em janeiro teve 146 homicídios, segundo a ONG Fogo Cruzado —, Rodrigo Maia também citou o tema mostrando que a preocupação no Congresso em ano eleitoral está muito além da reforma da Previdência. “Neste início de ano, a Câmara terá uma agenda muito clara: discutir de forma transparente as despesas do Estado brasileiro, a segurança pública deste país e de que forma o Congresso pode colaborar com a melhoria da segurança”, reforçou Maia.

Aposentadoria

À mesa junto à presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, e à procuradora-geral da República, Raquel Dodge, o presidente da Câmara também dedicou parte da sua fala ao microfone para pedir o empenho dos parlamentares não só na aprovação da reforma da Previdência, mas em uma revisão geral das contas públicas.

“Ninguém governará o Brasil no próximo ano se as reformas das despesas não forem feitas… Às vezes, um discurso fácil tem cinco minutos, 30 segundos de aplauso. Mas com um discurso duro, verdadeiro, com transformações verdadeiras para a sociedade, nós estaremos olhando para o futuro, para a futura geração, e garantindo a eles um Brasil melhor”, disse Maia, que, reservadamente a amigos, ainda não descartou a possibilidade de se candidatar à Presidência da República em outubro.

Em um dia cheio de reuniões com parlamentares no Palácio do Planalto, o presidente da República, Michel Temer, não compareceu à cerimônia e foi representado pelo ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, que levou a mensagem do Executivo ao Congresso. Lido pelo primeiro-secretário do Congresso, deputado Giacobo (PR-PR), o texto cobrava dos deputados a aprovação da reforma dizendo que “chegou a hora de tomar uma decisão”.

Em um texto sucinto, Temer exaltou as conquistas na atividade econômica em 2017, destacou que a inflação desacelerou de 10% para menos de 3% e que a taxa básica de juros recuou de 14,25% para 7%. Ressaltou, ainda, que o desemprego começou a ceder, bem como a redução do risco-Brasil. “Nossa economia voltou a crescer. A produção industrial, que retrocedia, agora apresenta crescimento. A safra de grãos bate recordes. O comércio exterior em 2017 registrou superavit de 67 bilhões de dólares”, destacou Temer.

O chefe do Executivo cobrou a aprovação da reforma, destacando que as atenções do governo estão voltadas para a “tarefa urgente de consertar” a Previdência. “O atual sistema é socialmente injusto e financeiramente insustentável. É socialmente injusto porque transfere recursos de quem menos tem para quem menos precisa, concentrando renda. É financeiramente insustentável porque as contas simplesmente não fecham, pondo em risco as aposentadorias de hoje e de amanhã”, ponderou.

Para Temer, a sociedade brasileira mostra-se cada vez mais consciente de que a reforma é “questão-chave” para o futuro do Brasil. “A reforma combate desigualdades, protege os mais pobres. Responde à nova realidade demográfica de nosso país e dá sustentabilidade ao sistema previdenciário”, enfatizou. Durante a leitura de Giacobo, parlamentares do PSol colocaram em volta da mesa dezenas de papéis colados uns nos outros com 320 mil assinaturas coletadas contra as mudanças nas regras da aposentadoria.

Os principais pontos

O presidente do Congresso Nacional, Eunício Oliveira, sugeriu uma agenda prioritária para a segurança pública. Confira:

» Votar o novo Código Penal em tramitação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado (PLS 236/12): em 2012, durante sete meses, uma comissão de juristas, presidida pelo ministro aposentado do Superior Tribunal de Justiça Gilson Dipp, elaborou uma proposta de atualização do Código Penal. Entre os temas, há polêmicas como a ampliação de crimes considerados hediondos e das possibilidades de aborto legal e a descriminalização do uso de drogas.

» Aprovar o Novo Código de Processo Penal e a Nova Lei de Execuções Penais em tramitação na Câmara (PL 8045/10): já votada no Senado, a proposta propõe mudanças nas regras de delação premiada, prisão preventiva, condução coercitiva e prisão em segunda instância.

» Votar a PEC que reorganiza as forças policiais da União e dos estados, bem como dá prerrogativa às guardas municipai: em tramitação no Senado, o texto reestrutura o modelo de segurança pública a partir da desmilitarização da polícia.

» Apreciar propostas que vedam o contingenciamento de recursos na área de segurança pública: uma delas é a PEC 118/11, aprovada no fim do ano passado na CCJ do Senado, que proíbe que o Executivo corte repasses ao Fundo Nacional de Segurança Pública.

» Assegurar condições para que o Ministério da Justiça exerça efetivo controle do tráfico de drogas e de armas, bem como do controle de fronteiras, garantindo os recursos necessários à pasta.

» Aprovar a obrigatoriedade da instalação de bloqueadores de celulares em presídios: votado em novembro do ano passado na Câmara, o PL 3019/15 está em análise agora no Senado.

» Criar um programa de construção de colônias agrícolas penais para presos de menor potencial ofensivo.

» Criar uma comissão mista extraordinária para propor medidas adicionais para tramitar em regime de urgência nas duas Casas.

» Propor a junção e a comunicação entre os órgãos de segurança pública e de inteligência.

Nova política de segurança prevê mais recursos a Estados ´parceiros´¹

Já está com o presidente Michel Temer a proposta de decreto feita pelo Ministério da Justiça para a criação da Política Nacional de Segurança Pública. Trata-se de um conjunto de diretrizes que visa, entre outras coisas, o aperfeiçoamento da troca de informações estratégicas entre os entes federativos visando o combate à violência, ao tráfico de drogas e ao crime organizado.

Após ficar cerca de um ano em consulta pública, a proposta chegou às mãos de Temer na sexta-feira e depende apenas da assinatura presidencial para começar a valer. Entre os principais objetivos descritos no texto está "fomentar a integração em ações estratégicas e operacionais, atividades de inteligência de segurança pública e gerenciamento de crises e de incidentes".

Na prática, o governo federal quer obrigar os Estados a contribuírem de forma mais efetiva nas ações de segurança. Como contrapartida, a União poderá conceder prioridade aos governadores no repasse de verbas, na doação de armas e equipamentos e no recebimento de criminosos nas penitenciárias federais.

O ministro da Justiça, Torquato Jardim, acredita que a divisão de responsabilidades prevista na Constituição – na qual os Estados são os gerentes da segurança e a União entra com apoio técnico e financeiro – nunca funcionou para valer. "Não dá nem pra dizer que fracassou, pois nunca funcionou", disse o ministro.

Torquato afirmou que o convite para que os Estados participem de forma mais ativa do sistema integrado de inteligência pode ser chamado de "imposição". Aqueles governadores que se engajarem na melhora de seus presídios e nas condições de trabalho das forças policiais também terão mais atenção de Brasília.

Não será possível, reconhece o ministro, punir de forma severa quem não colaborar. A tendência, no entanto, é que os repasses do Fundo Nacional de Segurança Pública passem a dar prioridade aos Estados que estabeleçam e executem projetos locais para o setor. "O Estado que compartilha inteligência e paga policiais em dia sai na frente. Quem protege as famílias dos policiais, com seguro de vida e escolas para os seus filhos, e que controla bem suas rodovias, também", diz.

Torquato considera a iniciativa como a primeira política nacional para o setor. Até então, segundo ele, o que houve foram planos nacionais de alcance mais curto, visando a resolução de problemas emergenciais. O plano atual, criado há um ano por Alexandre de Moraes, hoje ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), segue essa linha.

"Acredito que atingiu seus objetivos, considerando que foi feito no curto prazo", avaliou Torquato, ao mencionar a redução das rebeliões nos presídios. Questionado, no entanto, sobre o cumprimento de algumas metas, como a de redução dos homicídios em 17%, o ministro reconheceu que houve dificuldades.

"Não sei quais variáveis foram usadas para projeções tão otimistas", afirmou Torquato. Ele também afirmou que o plano não conseguiu "quebrar a espinha dorsal" do crime organizado, que é o fluxo de recursos financeiros movimentado pelas atividades ilícitas. "Mas isso demanda tempo."

O ministro criticou o uso excessivo das Forças Armadas no combate ao crime. Na avaliação de Torquato, os militares não estão tecnicamente e mentalmente preparados para ações como o combate a traficantes de drogas. De acordo com ele, a ação das Forças Armadas nesses casos têm que ser eventual, pontual e eficaz. "É chegar pra resolver", diz.

Não é isso, porém, que está no horizonte. O ministro acredita que os militares continuarão sendo convocados para ocupar as ruas das principais cidades do país. Torquato lembra que no governo Temer, com 20 meses, já houve 11 pedidos de operações de Garantia de Lei e da Ordem nos Estados. Esses pedidos são feitos quando há o esgotamento das forças tradicionais de segurança. "Quanto menos as Forças Armadas forem para a rua, melhor. Mas elas continuarão sendo convocadas", disse

¹com Valor Econômico / Murillo Camarotto

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