Cinco meses após anexação, Crimeia ainda tenta se adaptar à tutela russa

O sol queima sobre o centro de Sevastopol. Pessoas enfrentam pacientemente filas no calor. Elas esperam diante de bancos e prédios de escritórios. Desde a semana passada, também diante de lojas de telefonia. Um homem de cerca de 50 anos, de camiseta branca e óculos escuros, conta que seu chip para celular não tem mais créditos desde a manhã.

A rede ucraniana de telefonia móvel está cortada em grande parte da Crimeia. Quem pode compra agora um cartão pré-pago russo, para evitar as caras tarifas de roaming.

Muita coisa ainda não está correndo muito bem na "nova" Crimeia. Muita coisa é improvisada, temporária, parece não ter sido pensada muito bem. Cinco meses se passaram desde que a Rússia anexou a península ucraniana do Mar Negro.

Ainda existem muitas placas de trânsito ucranianas. E muitos motoristas simplesmente cobriram a bandeira ucraniana azul e amarela de suas placas com as cores russas: branco, azul e vermelho. Bancos ucranianos fecharam, e os russos quase não abriram ainda, por medo de sanções do Ocidente. Quase não há mais caixas eletrônicos funcionando. Quem precisa de dinheiro em espécie tem que enfrentar filas nos caixas.

Quem investiu seu dinheiro em um banco ucraniano agora tem que lutar para receber uma compensação de um fundo russo especialmente criado. Em rublos, claro, e não mais do que o equivalente a 14,5 mil euros por conta. Igor Savchenko se lembra como isso era uma guerra de papel: "Isto é simplesmente um jogo de azar, o fundo não funciona de forma confiável, alguns pedidos não são processados??, outros, sim." Savchenko teve sorte.

Destino para turistas russos

Turistas passeiam na orla, embora não tantos como de costume. Especialmente os ucranianos se mantêm longe. Mas os russos querem ver a lendária Frota do Mar Negro russa, que fica em Sevastopol desde a época do czar.

A maioria dos turistas russos acredita ter sido um erro histórico que a Crimeia tenha sido incorporada pela Ucrânia durante o período soviético. Lembranças da anexação são bastante procuradas, particularmente neste verão europeu: camisetas com retratos de Putin ou fotos dos famosos "homenzinhos verdes", os soldados em uniformes sem insígnia que ocuparam a Crimeia no início do ano.

Igor Savchenko balança a cabeça quando pensa nesse entusiasmo russo. Ele afirma que permanecerá um ucraniano e que manterá seu passaporte ucraniano. Mesmo que tenha que permanecer como estrangeiro em seu próprio país e tenha que solicitar uma autorização de residência às autoridades russas.

"Sou ucraniano! E, além disso, eu trabalho na minha universidade, aqui em Sevastopol, em cooperação com uma universidade em Viena, em um projeto de pesquisa. E, pelo que sei, a União Europeia não reconhece a Crimeia como parte da Rússia", afirma o jovem de 24 anos, que teme ser excluído do projeto de pesquisa caso adquira passaporte russo.

Jogadores de futebol sem clube

Na periferia, dois times de jovens jogam bola em um gramado ressecado. É hora de treino no clube de futebol Sevastopol. Muitos dos adolescentes de 14 e 15 anos de idade sonham com uma carreira profissional. O clube jogava na primeira liga ucraniana. Mas depois que a Rússia anexou a Crimeia, os sonhos deles passaram para um futuro distante.

"Nosso time profissional não existe mais. Agora estão tentando montar um novo. Claro que isso nos dá medo", diz Jaroslaw Zaitsev, um dos jogadores.

A nova administração russa da Crimeia proíbe o clube de continuar jogando na liga ucraniana. E a federação ucraniana de futebol nega uma mudança para a liga russa. Por isso, os jogadores profissionais deixaram Sevastopol para jogar em outros clubes ucranianos no continente.

Outros moradores da Crimeia estão felizes que agora fazem parte da Rússia. A aposentada Vera Taranova, por exemplo. Ela deixa uma das filas em Sevastopol agitando um envelope que traz estampado o emblema nacional da Rússia, a águia de duas cabeças.

Dentro do envelope está sua nova apólice russa de seguro de saúde. Ela é obrigatória na Rússia, sendo paga pelo Estado com dinheiro de impostos. "Na Ucrânia, ninguém cuidava da nossa saúde", argumenta.

Na Crimeia ucraniana, também era possível ter um seguro de saúde. Só que ele era pago do próprio bolso. "Agora, o Estado russo cuida de nós, e tudo é de graça novamente. Como na União Soviética!", afirma Vera. A nostalgia de tempos passados e melhores impera na Crimeia. E a Rússia tenta agora fazer com que eles voltem.

 

 

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