Os obstáculos para a união entre Boeing e Embraer

Lino Rodrigues

Além das restrições decorrentes da ação de classe especial (golden share) do governo brasileiro, que tem poder de vetar o negócio, um eventual acordo entre a Boeing e a Embraer terá que enfrentar também a oposição dos trabalhadores. O Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos, outras entidades de trabalhadores da região e o Sindicato dos Engenheiros de São Paulo marcaram para próxima semana o início de uma campanha nacional contra qualquer tipo de transação que represente a transferência do controle acionário da empresa brasileira para a norte-americana.

Os sindicalistas consideram que a venda da principal empresa da região pode transformar São José dos Campos (SP), em uma espécie de Detroit brasileira, a cidade americana que pediu falência em 2013 depois da crise que atingiu a indústria automobilística.

A confirmação das negociações entre as duas fabricantes de aviões, em 21 de dezembro, pegou os trabalhadores de surpresa na véspera do tradicional período de paralisação da fábrica para as festas de Natal e final de ano. Nas unidades de São José dos Campos, no Vale do Paraíba, e Gavião Peixoto, no interior paulista, que empregam mais de 25 mil trabalhadores, o clima desde o retorno ao trabalho, na quarta-feira passada, é de apreensão e preocupação com o futuro da empresa e dos empregos.

“A maioria dos funcionários vê com muita preocupação essa movimentação, porque a história das fusões tem mostrado que a empresa maior acaba destruindo a menor”, diz Herbert Claros da Silva, vice-presidente do sindicato, e mecânico ajustador da Embraer. Segundo ele, o sindicato já enviou carta ao governo federal cobrando uma posição contrária à venda da empresa à Boeing.

Na fábrica de São José dos Campos são produzidos os modelos da família 190, utilizados na aviação regional. O setor de montagem de jatos executivos ficou bem reduzido, desde que a produção dos jatos Phenom 100 e 300 foi transferida para uma nova unidade nos Estados Unidos.

Na área militar, alguns componentes ainda são produzidos em São José, mas a maior parte do trabalho dos aviões militares (os modelos Tucano e o cargueiro KC-390) é realizada pelos trabalhadores da unidade de Gavião Peixoto. No total, a Embraer emprega cerca de 18 mil pessoas nas duas fábricas e escritórios do país.

CONFLITO DE INTERESSES

Outro ponto que começa a surgir como um empecilho à negociação é a parceria da Embraer com a sueca Saab, que venceu a concorrência internacional para fornecer os caças do programa FX-2 do Brasil. Na época, a Boeing foi a grande derrotada na licitação, que acabou vencida pelos franceses.

Agora, uma parceria entre Embraer e Boeing pode gerar um conflito de interesses, já que americanos e franceses concorrem no mercado internacional. A questão foi colocada pelo ex-ministro da Defesa e das Relações Exterior, Celso Amorim: “A Suécia concordará em passar um segredo tecnológico para uma empresa que estará coligada a uma concorrente direta dela nesta área?”, questionou em artigo ao portal GGN.

O professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) e especialista em regulação, Cleveland Prates, não vê problemas ou conflito entre franceses e americanos. Segundo ele, a Embraer e a Saab têm um contrato que prevê uma série de situações com exigências para a possível entrada de um sócio em uma das empresas. “Não vejo problema, até porque a Boeing já sabia que a Embraer tem o contrato com a Saab”, diz Prates.

Para o especialista, ex-integrante do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), a Embraer só tem a ganhar com o negócio. A empresa brasileira, diz ele, é muito mais uma desenvolvedora de tecnologia do que propriamente uma geradora de recursos para o país. “Cerca de 70% da venda de uma aeronave equivale a insumos importados, ou seja, a Embraer desenvolve tecnologia e monta, mas para fazer isso compra componentes do resto do mundo. Mais importante que o símbolo nacional é a geração de riqueza. E se a Boeing está vindo para o Brasil para gerar riqueza e desenvolver tecnologias junto com a Embraer, só temos a ganhar com isso.”

A Embraer em números

Faturamento em 2016:

» US$ 7,1 bi

Receita por unidade de negócio

» Aviação comercial 57%

» Aviação executiva 18%

» Defesa e segurança 15%

Participação no capital*

» BNDES 15%

» Brandes 10,1%

» Mondrian 10,1%

» BNDESPar 5,1%

» BlackRock 5%

» Outros 64,5%

*O governo brasileiro é dono de uma ação especial “golden share”, que lhe dá o direito de vetar qualquer negócio

Estrutura

» 18 mil funcionários

» 2 fábricas em São Paulo

Principais aviões Militares

» Super Tucano

» KC – 390

Jatos executivos

» Phenom 100 e 300

» Legacy 500

Aviação comercial

» E195

» E195 – E2

Governo Temer retoma esta semana conversas com Embraer sobre Boeing¹

O governo Temer retoma esta semana conversas com a Embraer sobre sua associação com a Boeing. Informações desencontradas sobre a empresa de aviação têm deixado os players do mercado em alerta. Segundo um deles, “hoje parece a época em que o governo falava muito sobre preço de gasolina, se ela ia baixar ou subir, sem dar importância aos reflexos no mercado de ações da Petrobrás”.

Agora, o filme se repete. Ninguém sabe como o negócio será montado e integrantes do governo já informam que “não autorizam a venda do controle da Embraer”.

Embraer contrata Citi e Goldman como assessores em conversas com Boeing

A fabricante de aeronaves Embraer contratou os bancos de investimento Citi e Goldman Sachs, deixando players locais de lado, para assessorá-la em suas conversas com a americana Boeing. As companhias estão negociando uma eventual parceria, mas o modelo do negócio ainda não foi revelado.

A questão da segurança nacional é um dos nós que precisará ser desatado para que o negócio possa seguir em frente, caso envolva a área militar da companhia brasileira.

Outro fator que torna a negociação mais complexa é o poder de veto da União, que detém, desde a privatização da Embraer, uma ação especial da empresa, chamada de golden share. Do lado jurídico, o contratado pela brasileira foi Paulo Aragão, do escritório BMA Advogados. Procurados, Embraer, Citi, Goldman Sachs e BMA não comentaram.

Trabalhadores pedem reunião com ministro sobre Embraer²

A diretoria do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos, base dos funcionários da Embraer, pedirá uma audiência com o ministro da Defesa, Raul Jungmann, para tratar das negociações entre a fabricante brasileira de aviões e a Boeing.

O sindicato considera que Jungmann tem uma posição equivocada sobre uma possível combinação de negócios entre as empresas, envolvendo também a divisão de Defesa, além da de jatos comerciais.

"Uma possível venda da Embraer fere uma série de interesses, principalmente se for incluída a área de Defesa no negócio", diz o diretor do sindicato, Herbert Claros.

Segundo Jungmann, o governo brasileiro poderá apoiar uma parceria mais ampla entre a Boeing e a Embraer, envolvendo projetos das Forças Armadas, além dos jatos comerciais, desde que haja cláusulas que preservem o sigilo. O Brasil, disse o ministro, só não abre mão do controle da companhia, o que implicaria "flexibilizar a soberania nacional".

O sindicato é contrário à associação entre a Embraer e a Boeing e teme fechamento de postos de trabalho caso isso aconteça. A diretoria do sindicato também aguarda uma reunião com a direção da Embraer para discutir o negócio. Os sindicalistas cobram transparência da empresa nas negociações com a Boeing.

¹com Estadão Coluna Do Broadcast e Sônia Racy  e ²Época Negócios

 

Matérias Relacionadas

 

Editorial DefesaNet - Brasileiros Bonzinhos!!

28 DEZ, 2017

Editorial DefesaNet – Brasileiros Bonzinhos!!

EMBRAER CEO Paulo Cesar Silva no Roll Out do E2-195 Foto Lucas Lacaz Ag?ncia X9

26 DEZ, 2017

EXCLUSIVO – Mensagem CEO EMBRAER a Diretoria

Compartilhar:

Leia também

Inscreva-se na nossa newsletter