Pinochet tinha rede externa de espiões

A ditadura do general Augusto Pinochet (1973-90) manteve durante anos uma rede secreta de espionagem dentro e fora do Chile para perseguir opositores, monitorar a dissidência e abafar acusações de violação dos direitos humanos. A informação aparece em documentos secretos tornados públicos ontem .Catalogados e guardados por décadas como confidenciais, os arquivos foram obtidos pela agência de notícias alemã DPA. Eles mostram que o serviço secreto do regime – primeiro chamado Direção de Inteligência Nacional (Dina) e, depois, Central Nacional de Informações (CNI) – mantinha contatos diários com ministros, autoridades e diplomatas para coordenar as operações.

A rede, segundo a agência alemã, incluiria trocas de informações com outras ditaduras, o Vaticano e o FBI (polícia federal americana) e até mesmo o uso de jornalistas como colaboradores.

As operações detalhadas na documentação revelam ainda a perseguição a centenas de correspondentes dentro e fora do Chile, como Pierre Kalfon, do jornal francês "Le Monde".

Os arquivos expõem o esforço contínuo da ditadura para desacreditar opositores e ganhar aliados, operação que envolveu o atual deputado Alberto Cardemil, correligionário do atual presidente Sebastián Piñera e vice-ministro do Interior durante a ditadura. Ele enviou, por exemplo, arquivos sobre a ONG Vicariato da Solidariedade, em um amplo programa para minar a reputação de defensora dos direitos humanos da organização.

As equipes de inteligência enviavam ao governo detalhes até de debates em centros de estudo, o que chamavam de "ativismo intelectual". Os textos mostram ainda diálogos com o Vaticano para neutralizar setores da Igreja que criticavam as violações dos direitos humanos. O diretor da Dina, o coronel Manuel Contreras, tinha poder para investigar funcionários públicos, como mostra uma circular de 1975 com ordens diretas de Pinochet.

Em 1976, os poderes da Dina foram ampliados, e ela passou a investigar qualquer funcionário. Seu diretor, hoje preso e cumprindo uma centena de condenações, poderia inclusive dar ordens a ministros. A iniciativa foi planejada em junho de 1975 por Contreras, diante da visita da Comissão Interamericana de Direitos Humanos ao país. A missão, diz um documento, era "realizar uma campanha de ação psicológica" para neutralizar no mundo as denúncias de violações dos direitos humanos.

A coordenação entre a polícia secreta e os ministros continuou mesmo depois da dissolução do órgão, em 1978. A CNI, que substituiu a Dina, impulsionou operações na Bolívia, na Argentina e no Brasil, através das embaixadas, que enviavam informes sobre exilados, meios de comunicação e organismos humanitários.

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