Boeing e Embraer discutem um novo modelo de negócio

Fabio Graner

Nas discussões envolvendo as negociações das fabricantes de aviões Boeing e Embraer, uma das hipóteses recentemente levantada nos bastidores seria a criação de uma terceira empresa, com as duas sendo acionistas. A ideia, segundo apurou o Valor, não teria resistências no governo brasileiro, mesmo que essa eventual nova companhia tivesse participação majoritária da Boeing. Isso porque a fabricante de aviões nacional, nesse cenário, manteria sua independência, sem qualquer subordinação ao capital da americana.

É importante ressaltar, contudo, que ainda se trata apenas de uma sugestão levantada nos bastidores e não um movimento estruturado e em andamento pelas partes envolvidas. A alternativa é vista como uma das possíveis modalidades de parcerias entre a fabricante americana e a Embraer, dado que o governo brasileiro deixou claro à Boeing que não permitirá qualquer forma de controle sobre a companhia nacional, devido ao caráter estratégico e de segurança nacional.

A Boeing tinha intenção de comprar a empresa brasileira como movimento de mercado para fazer frente à concorrência da francesa Airbus, que tem conquistado terreno sobre a Boeing e ainda ficou mais forte após assinar parceria com a canadense Bombardier. Mas esbarrou no poder de veto do governo brasileiro conferido pela "golden share" (ação de classe especial que dá poderes maiores ao detentor) que detêm da companhia.

Diante da recusa inicial, o movimento seguinte da americana foi propor comprar apenas a parte de aviação comercial da Embraer, aceitando que o governo brasileiro mantivesse sua golden share no braço militar da Embraer, que ficaria separado. A alternativa proposta visava driblar a forte preocupação do governo brasileiro com questões de segurança nacional.

Mas a iniciativa também não prosperou. A visão do governo brasileiro é que tanto o braço comercial quanto o braço militar da companhia operam em uma espécie de "simbiose", com efeitos não só na geração de valor para a Embraer, mas também para a produção de tecnologia nacional importante para o desenvolvimento econômico do Brasil.

Ainda que seja considerado que o lado militar, que hoje representa cerca de 20% da Embraer, conseguiria sobreviver autonomamente pelo menos nos próximos cinco anos, a leitura no governo é que em prazos mais longos haveria dificuldade de que essa operação se sustentasse sozinha, com efeitos muito danosos não só para a Embraer como para o país.

É que não é apenas na aviação que a empresa está presente. A Embraer tem gerado tecnologia também usada na Marinha, por exemplo no submarino nuclear e em outros produtos navais, além das aplicações civis.

Nas discussões sobre o assunto, o governo brasileiro sempre considera que zelar pelo controle da empresa não significa um nacionalismo sem fundamento e sim uma postura que ocorre em todo o setor de aviação. Há quem lembre que se a Embraer tentasse comprar o controle da Boeing não teria a menor possibilidade de concretizar o intento. Isso porque o governo americano, mesmo sem golden share da companhia, tem direito de vetar movimentos de estrangeiros que possam colocar em risco questões consideradas de segurança nacional ou estratégicas.

A ideia de fazer parcerias, inclusive com outras possibilidades, como "marketing agreement", é bem vista pelo governo, dado o contexto do mercado internacional. Há um reconhecimento de que o setor vive um processo de concentração e acirramento da disputa entre as grandes empresas. Nesse ambiente, juntar-se à Boeing poderia ser positivo para a Embraer, ainda que a avaliação no governo é que a brasileira teria condições de seguir sozinha, caso não se chegue a um entendimento comum entre as partes.

Na verdade, o entendimento, pelo menos em parte do governo, é que o interesse maior de se juntar é da Boeing, que hoje sofre com custos mais elevados de produção, não tem penetração no segmento regional em que a Embraer opera e está perdendo a liderança para a Airbus. Além disso, a qualidade do departamento de engenharia da Embraer é considerado outro diferencial que a Boeing poderia agregar.

Um fator que pode dificultar um acerto entre as partes é a questão sobre como a Suécia e a Saab, empresa fabricante do caça Gripen, irão reagir a um entendimento entre a fabricante brasileira e a americana. Afinal, o acordo prevê transferência de tecnologia para fabricação desse tipo de produto no Brasil, mas vale lembrar que a Boeing é uma concorrente direta dos suecos. Basta recordar que o caça F-18 dos americanos disputou e perdeu para o produto sueco na licitação finalizada em 2013. O risco de um acordo é que os segredos tecnológicos dos suecos acabem nas mãos de um de seus principais concorrentes.

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