Espionagem enfraquece relação EUA-Alemanha

Por Noah Barkin | Reuters, de Berlim 
 
As relações entre a Alemanha e os EUA estão piores agora do que durante a invasão americana no Iraque, há uma década, disse ontem um importante aliado da premiê Angela Merkel, num sinal da crescente ira, em Berlim, com as táticas de espionagem americanas. 
 
Philipp Missfelder, porta-voz de política externa dos democratas-cristãos (CDU) de Merkel no Parlamento alemão, disse que Berlim deveria barrar o acesso dos EUA a um banco de dados das transações financeiras internacionais, a menos que Washington prometa cessar sua espionagem na Alemanha. A expectativa é que o parlamentar seja em breve confirmado como coordenador do governo para relações com os EUA. 
 
Relatórios divulgados nesta semana sugeriram que as negociações sobre um acordo de "não espionagem" – iniciadas após revelações, no ano passado, de que a Agência de Segurança Nacional dos EUA (NSA, em inglês) tinha monitorado o telefone celular de Merkel – estão próximas de um colapso porque Washington recusa-se a desistir de realizar escutas tendo como alvo um de seus mais próximos aliados no pós-guerra. 
 
"De modo geral, 2003 é visto como um ponto baixo nas relações germano-americanas", disse Missfelder, referindo-se ao antagonismo quanto à invasão do Iraque decidida pelo ex-presidente George W. Bush. "Mas, se olharmos para a situação atual de perda de confiança, o quadro não é melhor do que naquela época. De fato, provavelmente é pior, pois essa questão está preocupando as pessoas por mais tempo e mais intensamente do que a invasão do Iraque." 
 
Esses comentários, entre os mais duros ditos por uma importante autoridade alemã desde que veio à tona no ano passado a existência de um enorme programa de espionagem americano, foram feitos um dia antes do esperado anúncio, por parte do presidente Barack Obama, de reformas na NSA. A agência Reuters informou na semana passada ser improvável que Obama anuncie grandes mudanças em uma agência que tem recolhido enormes massas de dados brutos sobre os telefonemas de cidadãos americanos e "grampeado" as comunicações de líderes estrangeiros, inclusive Merkel, que em 2011 recebeu de Obama a Medalha Presidencial da Liberdade, a mais alta honraria civil americana. 
 
"Não somos mais vistos como amigos leais. Em vez disso, somos confrontados com uma grande dose de desconfiança", disse Missfelder. "Não estou dizendo que estamos num mesmo nível que países externos à Otan [Organização do Tratado do Atlântico Norte, a aliança militar ocidental], mas houve uma mudança qualitativa, ao menos do lado americano." 
 
Se a negociação do acordo de "não espionagem" não tiver êxito, Berlim deverá apoiar a suspensão de um acordo pactuado na esteira dos ataques terroristas em 11 de setembro de 2001 que dá aos EUA acesso ao Swift, banco de dados financeiro mundial, disse ele. 
 
O Parlamento Europeu aprovou no ano passado uma suspensão do acordo envolvendo acesso ao Swift devido a preocupações com que os EUA estariam bisbilhotando o banco de dados para obter vantagens financeiras, mas a votação foi simbólica e não tinha cumprimento obrigatório. Missfelder listou três principais exigências alemãs feitas aos EUA: um acordo mútuo de não espionagem, o fim de escuta focada em políticos específicos e um acordo geral sobre como os EUA utilizam a maior parte dos "metadados" que vêm armazenando. 
 
Ele disse ser contrário a condicionar a negociação de um acordo de livre comércio transatlântico ao êxito das negociações sobre espionagem e descreveu os EUA como um país "amigo". 
 
Mas acrescentou haver "enormes expectativas" vinculadas a uma próxima visita de Merkel aos EUA e falou da desilusão com Obama, festejado em Berlim em junho passado, no 50º aniversário do discurso em que John F. Kennedy declarou-se: "Ich bin ein Berliner". "Muita gente tinha grandes esperanças. As esperanças foram frustradas", afirmou Missfelder. 

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