Venezuela, um país à beira do colapso

Longas filas para comprar mantimentos, hiperinflação, hospitais sem medicamentos e racionamento de energia. A situação na Venezuela piora quase diariamente e, depois de 17 anos de chavismo, o país se encontra à beira da falência econômica e social – apesar de possuir a maior reserva de petróleo do mundo.

A luta pelo poder na arruinada Venezuela tem colocado o presidente do país, Nicolás Maduro, e a oposição, que detém a maioria na Assembleia Nacional, em rota de colisão. Além da baixa do preço do petróleo, Maduro busca justificar a grave crise econômica do país com bodes expiatórios – acusando empresários do país de instigarem uma guerra econômica contra ele por razões ideológicas – e com teorias da conspiração, afirmando que os EUA planejam invadir a Venezuela.

Ao periódico oficial do governo Gaceta Oficial, o presidente socialista afirmou conseguir "dormir feito um bebê" apesar da crise no país. No começo desta semana, ele emitiu um decreto que deve aumentar ainda mais as tensões na Venezuela, ao declarar "estado de exceção e emergência econômica" e atribuir poderes especiais às Forças Armadas. O decreto, válido primeiramente por 60 dias, também deve restringir o poder do Parlamento.

"Maduro quer governar como um ditador"

A coalizão de oposição Mesa de Unidade Democrática (MUD) tenta revogar o mandato do presidente – ex-motorista de ônibus e sucessor de Hugo Chávez – com a realização de um referendo ainda neste ano. Num primeiro passo, onde eram necessárias apenas 195 mil assinaturas, a oposição conseguiu obter o apoio de mais de 1,85 milhão de eleitores venezuelanos.

O governo se recusa a reconhecer a legitimidade e tenta retardar o processo. Maduro sabe que deve perder um suposto referendo e busca, com a distribuição de decretos, amarrar "medidas de ordem social […], assim como das áreas econômica, política e jurídica" ao Poder Executivo.

O secretário-geral da MUD, Jesús Torrealba, criticou o líder do país veementemente: "Maduro tenta governar por decreto […], o que significa que ele quer governar como um ditador." O líder opositor Henrique Capriles falou de uma "bomba que pode explodir a qualquer momento". Não é à toa que a oposição convocou para esta quarta-feira (18/05) manifestações em Caracas, tendo enfrentado bloqueio policial.

Caos na sociedade

A situação é extremamente tensa. Após 17 anos de governo socialista, a Venezuela sofre com a maior inflação do mundo, o desempenho da economia nacional despencou, as empresas se queixam da falta de divisas estrangeiras para pagar as importações. Em 2009, com 100 bolívares venezuelanos era possível comprar 40 quilos de arroz – atualmente é preciso desembolsar o quíntuplo.

Pessoas fazem filas em todos os tipos de estabelecimentos e serviços e se deparam constantemente com prateleiras vazias. O número no documento de identificação define em quais dias cada cidadão pode fazer compras em mercados estatais.

Imagens dramáticas de hospitais rodaram o mundo: recém-nascidos que morrem por falta de oxigênio para a ventilação mecânica. Faltam medicamentos importantes, e a higiene nos ambulatórios é catastrófica.

Além disso, a Venezuela sofre com cortes constantes e sistemáticos de energia. A maior hidrelétrica do país, com potência instalada de 10 mil megawatts (o equivalente a cerca de sete usinas nucleares) precisou reduzir significativamente a produção energética por falta de água.

Funcionários do conglomerado Polar, maior produtor privado de alimentos da Venezuela, afirmaram que as fábricas possuem matéria-prima suficiente para produzir pães somente até o fim deste mês. A produção de cerveja foi suspensa por falta de dólares americanos necessários para importar cevada.

Falência iminente

O preço do petróleo é um dos principais motivos para a iminente falência do Estado venezuelano. Apesar do leve aumento dos preços do petróleo, a queda anterior para abaixo dos 30 dólares por barril amplificou a crise venezuelana. Se em janeiro de 2015 o país lucrou 850 milhões de dólares com a exportação da commodity, no mesmo mês deste ano foram apenas 77 milhões de dólares.

Para piorar os prognósticos para o país, o governo venezuelano e a empresa estatal de petróleo PDSVA precisam quitar dívidas no valor de 6 bilhões de dólares em empréstimos internacionais ainda no segundo semestre deste ano, segundo a revista semanal The Economist.

Com isso, os caros programas sociais do governo socialista não devem mais ser financiáveis. Sem mencionar que, sem divisas estrangeiras, ficará cada vez mais difícil importar bens de consumo do exterior.

Analistas temem que estes 60 dias do decreto de "estado de exceção e emergência econômica" – visto também como uma provocativa prova de poder frente à Assembleia Nacional – terminem em violência.

 

Polícia bloqueia protesto anti-Maduro em Caracas

As forças de segurança da Venezuela usaram gás lacrimogêneo contra manifestantes em Caracas nesta quarta-feira (18/05), em meio a protestos em todo o país que pedem um referendo para revogar o mandato do presidente Nicolás Maduro.

No terceiro dia de protestos da oposição em uma semana, várias centenas de manifestantes se dirigiram ao centro da capital, com planos de marchar até a sede do Conselho Nacional Eleitoral (CNE).

Mas soldados da Guarda Nacional e a polícia isolaram o quarteirão onde os manifestantes planejavam se reunir. A multidão seguiu, então, para as ruas próximas, agitando bandeiras e gritando slogans contra Maduro.

Cerca de cem manifestantes foram alvo de gás lacrimogêneo quando tentavam furar uma barreira policial, disseram testemunhas.

"Eles estão assustados. Os venezuelanos estão cansados, com fome", disse o manifestante Alfredo Gonzales, de 76 anos, que usava um cachecol cobrindo a boca e disse ter sido alvo de spray de pimenta.

O presidente da Assembleia Nacional, Henry Ramos Allup, que encabeçou a marcha ao lado do líder da oposição, Henrique Capriles, qualificou de "insólito" que, para solicitar um referendo que está na Constituição, os oposicionistas tenham que enfrentar uma barreira policial. "Estamos promovendo uma saída constitucional à crise", afirmou.

Uma manifestação anti-Maduro na quarta-feira da semana passada também acabou em violência, com tropas usando gás lacrimogêneo para conter pessoas que atiravam pedras. Um policial usou spray de pimenta contra Capriles.

Maduro, que venceu a eleição para suceder o falecido presidente Hugo Chávez em 2013, acusa Capriles e outros líderes da oposição de tentativa de golpe com a ajuda dos Estados Unidos.

Capitalizando o descontentamento popular pela crise econômica do país, a coalizão da oposição Mesa de Unidade Democrática (MUD) ganhou controle da Assembleia Nacional nas eleições de dezembro passado. Todas as medidas legislativas, no entanto, foram derrubadas pela suprema corte, que apoia o governo.

 

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