AZEDO – Planalto adota uma saída Putniana

 

Luiz Carlos Azedo
Jornalista, colunista do Correio Braziliense
Matéria publicada originalmente em 17 Março 2016

 

 

Nota DefesaNet

A excelente anãlise do jornalista Luiz Carlos Azedo em chamar a engenharia adotada pelo Planalto como uma saída Putniana.

O Editor


Por mais que a presidente Dilma Rousseff tente manter a liturgia do cargo, seu governo acabou. Começa agora, com mão de gato, o terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que pode ser brevíssimo ou viabilizar a sua volta efetiva à Presidência nas eleições de 2018, dependendo do seu desempenho como uma espécie de primeiro-ministro encabulado.

Chefe da Casa Civil, Lula mandará no Diário Oficial da União, ou seja, na publicação de todos os atos do governo, desde as nomeações para cargos comissionados aos empenhos de verbas e assinatura de contratos de obras e de serviços. O resto são os detalhes da operação política.

A ida do ex-governador Jaques Wagner para a chefia de gabinete de Dilma completa a transferência de poder. Hábil negociador, administrará possíveis conflitos entre os dois, que não serão pequenos em razão da situação da economia e do caráter implosivo da Operação Lava Jato. Dilma procura se eximir de qualquer responsabilidade sobre os fatos investigados, o que resulta sempre em ampliar a responsabilidade de Lula pela existência do esquema, embora o ex-presidente diga sempre que não sabia de nada.

Diante da situação dramática em que se encontra a presidente da República, a entrada de Lula no governo foi uma cartada que vai além da simples chicana jurídica, como afirma a oposição. Um dos objetivos da entrada do petista no governo era sair da alçada do juiz federal Sérgio Moro, de Curitiba; com o direito a foro especial, Lula será julgado pelo Supremo Tribunal Federal.

Mal havia sido anunciado ministro, o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamoto, o faz-tudo do petista, entrou com um pedido para o processo que investiga lula, seus familiares e assessores seja remetido ao Supremo Tribunal Federal (STF). É provável que a Corte decida manter parentes e colaboradores a cargo da primeira instância.

O truco foi sobretudo político. A entrada de Lula na equipe do governo reanima os militantes petistas e restabelece canais de negociações com os antigos aliados e setores empresariais. O efeito colateral foi o vazamento de gravações de conversas comprometedoras do ex-presidente Lula, que estava grampeado pela Operação Lava-Jato, e a presidente Dilma Rousseff.

E a forte reação da opinião pública à nomeação de Lula para a Casa Civil, com protestos convocados instantaneamente pelas redes sociais nas principais cidades do país.

A nomeação de Lula para a Casa Civil foi uma saída putiniana diante da crise política, digamos assim. Segue a mesma lógica do revezamento no poder vigente na Rússia desde a primeira eleição do presidente russo Vladimir Putin.

Ele exercia o cargo de primeiro-ministro em 1999, quando o presidente Boris Iéltsin renunciou. Três meses depois, foi eleito presidente da Federação. Quando concluiu seu mandato, em 2008, indicou o primeiro-ministro Dimitri Medvedev como seu sucessor.

Entre 2008 e 2012, como primeiro-ministro, Putin foi mais poderoso do que o presidente da República. E, assim, voltou à Presidência em 2012, vencendo as eleições com 63% dos votos, cargo que exerce ainda hoje. O patrimônio oficial de Putin se resumiria a 3,7 milhões de rublos (cerca de R$ 2 milhões) em contas bancárias, um apartamento de 77m² em São Petersburgo, 260 ações do Banco de São Petersburgo e dois velhos automóveis Volga herdados de seu pai.

Ao tomar posse, declarou uma renda anual de 3,6 milhões de rublos (cerca de R$ 195,4 mil). Líderes da oposição, porém, questionam como o presidente russo poderia ter 11 relógios de luxo no valor estimado de US 700 mil com rendimentos tão modestos e o acusam de manter oculta uma fortuna estimada em US$ 40 bilhões.

Impeachment

Na entrevista que concedeu após anunciar a nomeação de Lula, Dilma destacou sua experiência como articulador político e conhecimento dos problemas do país. Deixou claro que sua missão no governo é estratégica. Diversas vezes chamou seu novo ministro de presidente, o que é de praxe no cerimonial do Palácio do Planalto.

Rechaçou, porém as especulações de mudança na equipe econômica e disse que Lula tem compromisso com a estabilidade da moeda e o equilíbrio fiscal. Negou também que se pretenda mexer nas reservas cambiais do país para aumentar os investimentos do governo.

Nada garante que a indicação de Lula para o governo vá salvar a presidente Dilma Rousseff do impeachment, mas a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de ontem, rejeitando os embargos de declaração apresentados pela Câmara dos Deputados, facilita sua atuação quanto ao controle da comissão especial que apreciará o pedido e o monitoramento da votação, que será aberta. Lula restabelece as pontes do governo com a ala governista do PMDB no Senado, que passou a ter o poder de afastar ou não Dilma Rousseff do cargo antes do julgamento do mérito do pedido.

Sob comando direto de Lula, além de o governo recuperar coesão interna e capacidade de iniciativa política no Congresso, também aumenta o seu poder de pressão em relação aos tribunais, à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal, sendo previsível um recrudescimento da campanha petista contra a Operação Lava-Jato. A crise econômica, porém, continua sendo a grande encruzilhada.

Em tempo: Moro divulga conversa de Dilma com Lula

No final da tarde, o juiz Sérgio Moro, retirou o sigilo de interceptações telefônicas de Lula. As conversas captadas pela Polícia Federal incluem diálogo gravado ontem com a presidente Dilma Rousseff. Na conversa, Dilma e Lula falam sobre o termo de posse. A presidente diz a ele que iria mandar o termo para que usasse somente “em caso de necessidade”.

A nomeação para a Casa Civil deu a Lula foro privilegiado no Supremo Tribunal Federal (STF). Com isso, a investigação sobre ele na Operação Lava Jato sai do alcance do juiz Sérgio Moro e passa para o âmbito do procurador-geral da República, Rodrigo Janot. O diálogo entre Dilma e Lula gravado pela Polícia Federal foi o seguinte:
 

– Dilma: Alô
– Lula: Alô
– Dilma: Lula, deixa eu te falar uma coisa.
– Lula: Fala, querida. Ahn
– Dilma: Seguinte, eu tô mandando o ‘Bessias’ junto com o papel pra gente ter ele, e só usa em caso de necessidade, que é o termo de posse, tá?!
– Lula: Uhum. Tá bom, tá bom.
– Dilma: Só isso, você espera aí que ele tá indo aí.
– Lula: Tá bom, eu tô aqui, fico aguardando.
– Dilma: Tá?!
– Lula: Tá bom.
– Dilma: Tchau.
– Lula: Tchau, querida.


Nota oficial

Na noite ontem (16 Março 2016), a assessoria do Planalto divulgou nota para explicar a razão pela qual divulgou a imagem do termo de posse de Lula sem assinatura da presidente Dilma Rousseff.

Eis a íntegra:
 

Nota à imprensa

Para conhecimento público, divulgamos cópia do termo de posse assinado hoje à tarde pelo ex-presidente Lula e que se encontra em poder da Casa Civil. Esse termo foi objeto do telefonema mantido entre o ex-Presidente Lula e a Presidenta Dilma Rousseff, sendo, no dia de hoje, divulgado, ilegalmente, por decisão da Justiça Federal do Paraná.

A Presidente assinará o documento amanhã em solenidade pública de posse, estando presente ou não o ex-Presidente Lula.

A transmissão de cargo entre o Ministro Jaques Wagner e o ex-Presidente Lula foi marcada para a próxima terça feira. Trata-se de momento distinto da posse.

Finalmente, cabe esclarecer que no diálogo entre o ex-Presidente Lula e a Presidente Dilma a expressão “para a gente ter ele” significa “o governo ter o termo de posse”, assinado pelo Presidente Lula, para em caso de sua ausência já podermos utilizá-lo na cerimônia de amanhã. Por isso, o verbo não é “usa”, mas sim o governo usar o referido termo de posse.

Assim, o diálogo foi realizado com base nos princípios republicanos e dentro da estrita legalidade.

Secretaria de Imprensa
Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República


 

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