CHINA – O que deu errado no projeto de produzir suas próprias commodities

 

Uma mina de minério de ferro de US$ 10 bilhões que levou mais de oito anos para ser desenvolvida perto do remoto porto de Cape Preston, na Austrália, é um exemplo claro de como muito do esforço chinês de mais de dez anos para comprar matérias-primas ao redor do mundo deu errado.

A mina Sino Iron, da Pacific, custou cerca de quatro vezes o seu orçamento inicial e analistas que monitoram o projeto dizem que é provável que ela tenha um prejuízo de centenas de milhões de dólares em 2014, seu primeiro ano completo de produção. A Citic Pacific, subsidiária da gigante estatal chinesa Citic Group, que tem capital aberto em Hong Kong, e suas empreiteiras cometeram uma série de erros, de pensar que importariam trabalhadores com níveis salariais dos chineses a apostas fracassadas em câmbio, o que levou a companhia a procurar um socorro de US$ 1,5 bilhão de sua matriz.

E, embora a Sino Iron pelo menos esteja embarcando minério, ela permanece presa numa batalha legal com seu sócio local, Clive Palmer, um magnata do setor imobiliário que se tornou político e agora acusa a Citic Pacific de se apossar de recursos australianos sem pagar integralmente por eles.

"Foi um processo de aprendizado doloroso", diz Zhang Jijing, que passou 16 anos conduzindo a empresa australiana do Citic Group antes de ser indicado, no fim de 2009, como diretor executivo e superintendente da subsidiária Citic Pacific, que recentemente mudou de nome para Citic Ltd.

Nos últimos dez anos, a China se apressou em comprar commodities globais à medida que sua economia florescia — tanto para alimentar suas fábricas quanto para ter certeza de que não ficaria dependente de matérias-primas produzidas pelas potências ocidentais. Os investimentos internacionais da China nesses produtos atingiram US$ 53,3 bilhões em 2013, ante US$ 8,2 bilhões em 2005, segundo dados compilados pelos centros de estudos American Enterprise Institute e Heritage Foundation.

Agora, está se tornando claro que a maratona de compras da China gerou muitos investimentos ruins. Muitas empresas grandes estão perdendo dinheiro, enfrentando custos inesperados ou produzindo muito menos que o esperado. Alguns investidores chineses estão se afastando das matérias-primas — uma mudança que pode levar menos dinheiro chinês para regiões como África, América Latina e Oriente Médio.

As razões para os problemas chineses variam. A China chegou tarde no boom das matérias-primas e com frequência pagou caro por ativos nos quais as empresas ocidentais não tinham interesse ou queriam vender. A China pagou 20% mais por ativos de petróleo e gás que a média do setor, estima Scott Darling, diretor de pesquisa do setor para o J.P. Morgan Chase
 
A China Petroleum & Chemical também conhecida como Sinopec, pagou US$ 4,64 bilhões em 2010 pela participação empresa canadense de areias betuminosas Syncrude Canada Ltd. O preço tinha um prêmio de 10% em relação ao valor de mercado do ativo, aferido pela avaliação de mercado de sua principal acionista, a Canadian Oil Sands Subsequentemente, o projeto sofreu atrasos pelos custos crescentes e queda de produção, segundo dados financeiros da Canadian Oil Sands.

A Sinopec informou que o projeto Syncrude era o único de areias betuminosas dessa dimensão disponível naquele momento cujo preço era razoável. A produção do Syncrude e sua lucratividade estavam estáveis até recentemente, informa a Sinopec, que espera que o projeto opere durante 60 anos e se torne lucrativo no longo prazo.

A CnoocLtd. pagou US$ 15,1 bilhões em 2012 pela produtora de energia canadense Nexen Inc., cujo lucro líquido é hoje menos de 20% do total registrado em 2010. A empresa sofre com a queda dos preços do gás natural, queda de produção dos campos principais e outros problemas.

A Cnooc informou que o desempenho da Nexen desde a fusão está em linha com as expectativas e os ativos estão operando de forma estável.

Em abril, o Irã cancelou um negócio de US$ 2,5 bilhões com a China National Petroleum Corp. para desenvolver um campo de petróleo chamado South Azadegan depois que autoridades iranianas alegaram que a China estava superfaturando os preços de equipamentos de perfuração e serviços, provocando atrasos no projeto. Um mês antes, o vice-ministro do Petróleo do Irã, Mansour Moazzami, disse que a CNPC estava correndo o risco de perder um contrato de US$ 4,7 bilhões para desenvolver o campo de gás gigante South Pars porque a empresa não conseguiu fazer avanços significativos. A CNPC não respondeu aos pedidos de comentários.

Projetos de mineração e petróleo são complicados por natureza e as produtoras ocidentais de matérias-primas frequentemente têm de lidar com seus próprios problemas. Alguns analistas dizem que a China está simplesmente acordando para a dura realidade que há muito as empresas ocidentais enfrentam nesses projetos.

Alguns dos maus negócios chineses poderiam dar lucro se a oferta mundial de commodities ficar limitada e os preços subirem. Um punhado dos maiores negócios chineses, incluindo a compra dos ativos de petróleo da russa OAO Rosneft por US$ 3,5 bilhões pela Sinopec em 2006, parece estar perto de gerar lucro, segundo dados das empresas e relatos na imprensa.

Grandes negócios chineses ainda estão sendo feitos. Em abril, uma unidade da China Minmetals Corp. liderou um consórcio para comprar uma mina de cobre peruana da GLNCY  Mas as autoridades chinesas reconhecem as dificuldades. No ano passado, o presidente da associação das mineradoras da China estimou que 80% dos negócios de mineração no exterior haviam fracassado, embora ele não tenha dado detalhes, segundo a mídia estatal.

Em junho, o Escritório de Auditoria Nacional da China culpou a má gestão por prejuízo em pelo menos dez investimentos estrangeiros da China Investment Corp., o fundo soberano de US$ 600 bilhões que colocou dezenas de bilhões de dólares em empresas de matérias-primas entre 2009 e 2012. O escritório não especificou quais negócios.

O CIC está se afastando de investimentos em petróleo e energia para outros setores, segundo pessoas próximas ao fundo. Os negócios com petróleo, gás e metais caíram para 65% dos investimentos estrangeiros da China em 2013, ante 80% em 2005, segundo o American Enterprise Institute e o Heritage Foundation. E os US$ 53,3 bilhões que o país investiu em commodities em 2013 ficaram abaixo do recorde de US$ 57,5 bilhões de 2011.

O Ministério do Comércio da China informa que elevou os esforços para avaliar investimentos estrangeiros e conscientizar as empresas dos riscos e responsabilidades existentes no exterior.

"O governo alertou que a partir de agora 'comprar qualquer matéria-prima por qualquer preço' acabou", disse o analista Yang-liang, do BNP Paribas

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