A TAP quer o Brasil

MARINA GAZZONI E GLAUBER GONÇALVES

A privatização da companhia aérea portuguesa TAP deve voltar aos holofotes. Depois de vender as estatais de energia EDP e REN, o governo português prepara agora a privatização da aérea. Uma avaliação da empresa já foi feita e a escolha dos assessores financeiros e jurídicos deve ser anunciada nas próximas semanas. Líder no tráfego aéreo entre Brasil e Europa, a TAP é peça-chave no cenário de consolidação do setor. No mercado, ainda não há favoritos. Mas, segundo fontes próximas ao negócio, o governo português quer vender a aérea a um grupo do Brasil.

O presidente da TAP, o brasileiro Fernando Pinto, diz que a oferta está aberta a todos os interessados, mas confirma que o governo português é simpático a investidores brasileiros. "Portugal está muito voltado ao Brasil. Não tenho dúvida de que o governo veria com bons olhos algum investimento vindo daqui", disse o executivo em entrevista ao Estado, no Rio de Janeiro.

As autoridades portuguesas têm feito uma "campanha" para vender a empresa a um grupo brasileiro. O primeiro-ministro português, Pedro Passos Coelho, se reuniu com a presidente Dilma Rousseff em outubro, em Brasília, e manifestou desejo de ter brasileiros na disputa pelas estatais portuguesas. Um dos principais entusiastas da ideia é o ministro de Assuntos Parlamentares de Portugal, Miguel Relvas, que veio ao País no fim de 2011 para tratar do tema com autoridades e empresários.

O principal argumento dos portugueses para convencer os brasileiros é a oportunidade de se criar uma companhia verde-amarela de atuação global. "Uma empresa do Brasil que queira ter acesso a 46 cidades da Europa tem uma solução pronta na mão com a TAP", disse Pinto.

Mercado estratégico

A TAP é dona de 30% dos voos do Brasil à Europa, segundo dados da Agência Nacional de Aviação Civil (anac). A empresa é também a estrangeira com mais destinos no País: faz voos da Europa para dez cidades. O Brasil é ainda o maior mercado da companhia – responde por 26% do faturamento de 2,5 bilhões de 2011.

A expectativa dos portugueses é que os investidores possam ter acesso a recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para financiar a compra. Mas o governo brasileiro parece estar relutante em relação a esse apoio.

O motivo, segundo uma fonte de Brasília, é um entrave na lei europeia: os brasileiros não podem ter 100% do controle da empresa. Pelas regras da União Europeia, companhias de países de fora do bloco só podem ter 49% do capital votante de aéreas do continente.

O processo de venda é considerado estratégico para Portugal. A TAP é a maior companhia exportadora do País – cerca de 70% da sua receita vêm do exterior. "E, como ela traz turistas e negócios ao país, a importância econômica é maior", disse Pinto. Diante disso, segundo ele, Portugal não fará um leilão, pois avaliará, além do preço, os impactos do negócio no país. "A manutenção das operações em Lisboa é uma garantia que o governo vai exigir", disse o executivo.

Dois bancos de investimento – Citibank e Caixa Geral de Depósitos – já fizeram uma análise de quanto a TAP vale. O resultado, porém, é guardado a sete chaves. O Estado apurou que o governo português quer vender a empresa por 7 a 8 vezes o seu Ebtida. Descontada a dívida, de 1 bilhão, o preço estaria em torno de 1,2 bilhão.

Para um consultor em aviação, que não quis se identificar, o valor pode estar superestimado. Pressões sindicais fortes em Portugal e as perspectivas econômicas negativas para a Europa desvalorizam a empresa, diz.

Alguns sindicatos do setor são contra a privatização e acusam a empresa de ter sua rentabilidade corroída pela TAP Manutenção e Engenharia Brasil, a antiga VEM, comprada da Varig em 2006. Sob a gestão da TAP, a subsidiária nunca deu lucro. Só em 2011 suas perdas somaram 66 milhões e soterraram os ganhos de 3 milhões que a companhia aérea teve no ano passado, deixando o grupo no vermelho. A TAP Manutenção entrará no bolo da privatização.

Negócio difícil

Apesar da demonstração do governo português de que quer a entrada de uma aérea brasileira no capital da TAP, o mercado não vê capacidade ou disposição nas empresas para abraçar o negócio.

A companhia brasileira mais próxima da TAP hoje é a TAM. As duas pertencem à aliança de empresas Star Alliance e, segundo o Estado apurou, os executivos já tiveram conversas informais sobre a questão. "Seria um negócio ótimo para a TAM. Eles poderão fazer voos do Brasil até a Ásia, com parada na Europa", disse o consultor em aviação Nelson Riet.

Apesar das vantagens, o momento não é favorável para aquisições pela TAM. A empresa está em fase final da fusão com a chilena LAN. "O processo de fusão demanda um esforço exaustivo das duas corporações. Acredito que eles não farão um movimento tão pesado de aquisição de uma terceira empresa", disse o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Respicio Espírito Santo, especialista em transporte aéreo.

Em comunicado, a TAM disse apenas que "no momento, dedica integralmente seus esforços na criação da Latam", sem confirmar ou negar interesse na TAP. Sua maior concorrente no Brasil, a Gol, negou, em comunicado, que teria interesse na TAP. A Azul não comentou a questão.

Mas outro grupo brasileiro olha com atenção a venda da TAP. O empresário German Efromovich, dono do grupo Avianca, foi a Portugal para discutir a privatização da empresa com autoridades locais e com Fernando Pinto. Procurada, a Avianca não comentou o tema.

Sem citar nomes ou informar quantas são, o presidente da TAP confirmou que tem participado de reuniões com executivos de "várias" companhias aéreas, incluindo brasileiras.

A venda da TAP será um teste da relevância das alianças globais no processo de consolidação do setor. O único grupo que declarou abertamente interesse na TAP foi o International Airlines Group ou IAG, dono da British Airways e da Iberia, e membro da Oneworld. O mercado aguarda uma reação das empresas da Star Alliance, como a alemã Lufthansa e a americana United Airlines, para evitar que a aliança perca um parceiro na rota Brasil – Europa.

O calendário da privatização não está fechado, segundo Pinto. Mas a expectativa dele é de que até o fim do ano o novo dono da TAP já tenha sido anunciado e só dependa de aprovações de autoridades europeias para concluir a compra. É cedo para dizer quem vencerá. Mas seja quem for, haverá reflexos no Brasil.

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