Nas mãos apenas dos pilotos – Pousos e decolagens dependem da habilidade dos comandantes

Antônio Temóteo


O Brasil possui 2.566 aeródromos registrados na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), dos quais 1961 são privados e 605 são públicos. Levantamento do Correio aponta que, desse total, 95,4% possuem operações exclusivamente visuais e dependem das habilidades dos pilotos para pousos, decolagens e movimentação de aeronaves.

Essa é a realidade, por exemplo, do aeroporto de Paraty (RJ), que era o destino do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki, morto em um acidente antes de chegar ao local. Especialistas alertam que pilotos são pressionados por patrões a voarem para terminais que não possuem torre de controle e instrumentos mesmo em condições climáticas que colocariam em risco a vida dos tripulantes e passageiros.

Pelas normas vigentes no Brasil, uma aeronave só pode aterrissar em um aeródromo em condições visuais se o piloto conseguir enxergar a pista a cinco quilômetros de distância e, ao mesmo tempo, tiver pelo menos 450 metros de teto. Se as condições climáticas não forem favoráveis, o piloto deve retornar ao aeroporto de origem ou buscar um destino alternativo.

Somente 120 aeródromos brasileiros possuem operação por instrumentos, dos quais 114 são públicos e seis são privados. Nesses terminais, o pouso é possível pela orientação por equipamentos e contatos com a torre de controle de voos.

Além disso, somente 755 aeródromos no país são asfaltados, o que correspondem a menos de um terço do total. As superfícies para pousos e decolagens têm os mais variados tipos. Pelos registros da Anac, existem pistas de areia, argila, cascalho, concreto, grama, saibro, aço, terra, barro e piçarra.

Apesar de os dados apontarem para uma situação precária, os 10 maiores aeroportos do país concentram 66% dos embarques em voos domésticos no país. Esse percentual chega a 85% quando são considerados só os 20 terminais que concentram o maior número de passageiros.

Em 2012, durante o governo Dilma Rousseff, o então ministro da Secretaria de Aviação Civil da Presidência da República, Wagner Bittencourt, lançou um programa que investiria R$ 7,3 bilhões para melhorar a infraestrutura de 270 aeroportos.

De lá para cá, quatro ministros substituíram Bittencourt, a pasta foi extinta e nenhum projeto saiu do papel. No governo de Michel Temer, o único avanço sobre o tema foi um corte de 94 terminais que receberiam recursos do plano de aviação regional.

Em agosto de 2016, o ministro dos Transportes, Maurício Quintela (PR-AL), anunciou que 176 aeroportos receberiam R$ 1,2 bilhão em investimentos. Além disso, ele detalhou que 53 terminais seriam prioritários, com investimentos de R$ 300 milhões a partir de 2017.

Condições

Mesmo com a maioria dos aeroportos brasileiros operando apenas em condições visuais, o comandante Adriano Castanho, diretor do Sindicato Nacional dos Aeronuatas (SNA), avalia que, em condições meteorológicas favoráveis, os pilotos fazem pousos e decolagens seguros nessas localidades. Conforme ele, investimentos em instrumentos para orientação de aeronaves e na construção de torres de controle só são viáveis quando há demanda por voos para o terminal.

Castanho alerta, entretanto, que o Brasil está aquém em relação a infraestrutura aeroportuária de outros países e muitos terminais precisam ser modernizados, mesmo aqueles que possuem equipamentos para auxiliar pilotos durante os voos.

Ele detalhou que, no Nordeste, a operação visual é possível em quase todo o ano. Entretanto, no Sudeste e no Sul, as variações climáticas ocorrem em maior intensidade e podem impedir pousos e decolagens. Conforme Castanho, o sindicato recebe relatos de que pilotos são pressionados a voar em condições inadequadas e em alguns casos, por falta de conhecimento, se arriscam em viagens que deveriam ser adiadas. “Vai do profissionalismo de cada piloto. São necessários cuidados para voar, sobretudo se o tempo não estiver bom”, comentou.

Na opinião do piloto Ivan Bitar, mestre em meteorologia, o mais prudente é treinar o piloto para que ele saiba tomar decisões em situações atípicas ao invés de construir torres de controle em todos os aeródromos do país. O especialista detalhou que, durante a formação do piloto, os ensinamentos sobre meteorologia são básicos. “Muitos estão preocupados somente em fazer a prova da Anac.

Não estão preparados para saber o que fazer ao entrar em uma tempestade, ou quando há formação de gelo na aeronave. E até mesmo o que fazer quando pegam turbulências severas em céu claro”, destacou.

Priorizar a modernização dos aeródromos em que há maior demanda por voos é a medida adequada para melhorar a infraestrutura aeroportuária do país, avalia o especialista em aviação civil Omar Daniel Martins Netto.

Ele destacou que o Brasil, que possui dimensões continentais, tem restrições financeiras para equipar os terminais com torres de controle e instrumentos, sobretudo em meio a crise econômica. “O terminal precisa de demanda para custear esses equipamentos e a manutenção. Temos milhares de aeródromos com pistas de terra, de grama e cascalho. Com isso, o governo precisa piorizar suas ações”, disse.

Destroços do avião são içados do mar

Os destroços do avião em que viajava o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki, morto em acidente aéreo na última quinta-feira, começaram a ser recolhidos do mar na noite de ontem. O avião, um bimotor modelo King Air C90GT, fabricado pela Hawker Beechcraft, caiu na água, a cerca de dois quilômetros de Paraty, no litoral sul do Rio. Quatro pessoas morreram, além de Teori.

Por volta das 18 horas, chegou ao local a balsa com um guindaste acoplado para fazer a operação. A vinda da embarcação foi necessária porque o local onde o avião caiu tem profundidade de apenas três metros.

Boatos negados

A Aeronáutica desmentiu ontem um boato que circula pelas redes sociais de que o piloto Osmar Rodrigues teria sido orientado de maneira equivocada pela torre de controle do Rio de Janeiro. Rodrigues pilotava a aeronave que caiu no mar próximo a Paraty (RJ) e transportava o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki e outras três pessoas. Todos morreram no desastre aéreo.

Segundo a mensagem que circula nas redes sociais, um homem identificado como sargento Marcondes teria dado orientações equivocadas a Rodrigues e essas seriam uma das causas da queda da aeronave. A sabotagem teria como finalidade interromper as investigações da Operação Lava-Jato, que investiga um esquema de corrupção bilionário que desviou recursos da Petrobras e de outras estatais.

Em nota, a Aeronáutica desmentiu o boato e afirmou que não existe uma pessoa com esse nome na equipe de serviço responsável pela área de controle, nem havia qualquer comunicação com o piloto durante a aproximação para pouso em Paraty. Os militares esclareceram ainda que o aeródromo da cidade não possui órgão para controle de tráfego aéreo. “Ressaltamos que todos os procedimentos realizados pelos órgãos de controle durante o voo estiveram de acordo com as legislações vigentes, inerentes aos serviços de controle de tráfego aéreo”, informou a nota.

O gravador de voz da cabine do avião que caiu com Teori já está em Brasília, no Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), para ser analisado. Lá podem estar conversas que o piloto teve com a torre de comando do aeroporto de Congonhas, registradas enquanto o avião estava ainda em São Paulo, e, já em Paraty, área não controlada. Além disso, podem ser encontradas comunicações com pilotos de outras aeronaves que estivessem voando pela região, em que o piloto pode ter relatado a baixa visibilidade.

O avião saiu de São Paulo (SP) às 13h01 com Teori , o empresário Carlos Alberto Filgueiras, dono da aeronave, a massoterapeuta Maíra Panas e sua mãe, a professora Maria Hilda Panas, com destino a Paraty, e caiu no mar perto da Ilha Rosa, após meia hora de voo e a dois quilômetros da cabeceira da pista do aeroporto da cidade do Sul Fluminense.

Segurança de aviões pequenos será tema de audiências públicas¹

Metade dos acidentes aéreos no Brasil acontece com aeronaves de pequeno porte e privadas. O vice-presidente da Comissão Especial do Senado que examina o projeto que institui o Código Brasileiro de Aeronáutica, senador Pedro Chaves (PSC-MS), vai pedir a realização de audiências públicas para debater a segurança de voo dos pequenos aviões.

Ele sustenta que a discussão do Projeto de Lei do Senado (PLS) 258/2016 tem que ser aprofundada para que o novo código consiga reduzir o número de acidentes aéreos no Brasil.

¹com Agência Senado Federal

Compartilhar:

Leia também

Inscreva-se na nossa newsletter