Posse de Chávez gera apreensão e incerteza na Venezuela

Claudia Jardim

Na origem dessa polêmica está a incerteza sobre a presença do presidente Hugo Chávez – convalescente em Cuba após sua quarta cirurgia para combater um câncer – na cerimônia de posse para o seu novo mandato, na quinta-feira, dia 10 de janeiro.

Governo e oposição têm interpretações diferentes sobre como proceder caso Chávez não seja juramentado para o mandato até 2019, para o qual foi eleito em outubro.

Nos próximos dias, a Assembleia Nacional – de maioria governista – deve enviar uma consulta ao Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) solicitando um parecer favorável ao adiamento da posse, sob a interpretação de que há uma continuidade do governo Chávez, razão pela qual o governo diz considerar mera "formalidade" a cerimônia de posse.

A oposição rejeita essa interpretação e diz que, se na quinta-feira Chávez não comparecer à posse, o Parlamento deverá declarar sua ausência temporária e solicitar à Corte Suprema que uma equipe médica avalie as condições de saúde do presidente para determinar se ele poderá, ou não, assumir o mandato.

"Não se trata de formalidade. Se não comparecer, ele (Chávez) passaria a ser presidente eleito em situação de ausência temporária", afirmou à BBC Brasil Gerardo Blyde, advogado e prefeito opositor do município de Baruta, Caracas.

Se a junta médica determinasse que Chávez não está em condições de continuar na Presidência, seria decretada a "ausência permanente", e novas eleições deveriam ser convocadas em 30 dias consecutivos à decisão.

'Golpe constitucional'

Em ambos casos, a Presidência seria assumida interinamente por 90 dias pelo presidente da Assembleia Nacional, Diosdado Cabello, que chefiaria o governo até a posse do próximo presidente eleito.

Caso contrário, na opinião do jurista Asdrubal Aguiar, ex-magistrado da Corte Interamericana de Direitos Humanos, o governo cometeria um "golpe constitucional".

A coalizão de oposição Mesa de Unidade Democrática (MUD) convocou uma reunião de emergência nesta segunda-feira para avaliar a situação e decidir sobre que ações tomar.

Para o deputado governista Roy Daza, a MUD se nega a interpretar uma situação "inédita" e busca uma "justificativa" para fortalecer a tese de vazio de poder e preparar o caminho para um "golpe de Estado".

"Aqui não haverá vazio de poder", afirmou à BBC Brasil Daza, do governista Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV). "Chávez continua sendo o presidente em exercício, e o que estamos discutindo é que se cumpra o mandato popular (resultado da eleição) de 7 de outubro."

Afetado por uma "severa" infecção pulmonar, é pouco provável que Chávez regresse à Caracas para ser juramentado. Se confirmada a ausência de Chávez, será a primeira vez na história democrática do país, desde 1959, que o presidente falta na posse.

"Chávez continuará sendo o presidente além de 10 de janeiro", afirmou o deputado Diosdado Cabello, o número dois na hierarquia chavista, pouco depois de sua reeleição como presidente da Assembleia Nacional, no sábado.

Sua manutenção na liderança do congresso é vista como uma demonstração de unidade e força entre os governistas, em meio a rumores de que haveria um racha entre Cabello e o vice-presidente, Nicolás Maduro.

A solução do impasse estará nas mãos do TSJ, que ainda não se pronunciou sobre o caso. Ao que tudo indica, deverá dar parecer favorável à interpretação do Executivo.

Antes de viajar a Havana, em dezembro, para ser operado, Chávez antecipou a crise, ao apontar Maduro como sucessor e candidato presidencial caso sua saúde o impeça de assumir o novo mandato.

Nas ruas, o clima de comoção entre os simpatizantes do governo permanece.

Alguns se arriscam a pensar sobre o futuro sem Chávez e afirmam que serão "leais" à decisão do presidente, caso novas eleições tenham de ser convocadas.

Outros, principalmente os mais idosos, apelam à fé e dizem acreditar na recuperação do líder venezuelano. "Ele é o homem das dificuldades, das grandes batalhas, ele vai se curar", disse a aposentada Nora Cáceres.

Constituição

O artigo 231 da Constituição, alvo da polêmica, determina que o presidente tome posse diante do Parlamento em 10 de janeiro, mas também afirma que, "por qualquer motivo inesperado", o presidente pode ser juramentado pelo TSJ, sem especificar a data ou local da cerimônia.

Amparado na ambiguidade da segunda parte do artigo, o governo pretende fortalecer a tese de "extensão" do mandato presidencial, flexibilizando assim a obrigatoriedade do dia da posse.

"O presidente reeleito continua no cargo e tem uma autorização da Assembleia Nacional para cuidar de sua saúde. Quando puder, tomará posse, já como presidente em funções", afirmou Maduro, no sábado, logo depois de acompanhar a eleição na casa.

A tese de continuidade do atual mandato garante que o gabinete se mantenha intacto, sem alterações que poderiam, na opinião de analistas, perturbar a unidade chavista neste momento de crise.

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